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Princípio da legalidade: veja suas características, seu objetivo e exemplos

Princípio da legalidade: veja suas características, seu objetivo e exemplos

29 mar 2022
Artigo atualizado 14 jun 2023
29 mar 2022
ìcone Relógio Artigo atualizado 14 jun 2023
O princípio da legalidade se trata de uma norma que representa a liberdade do cidadão brasileiro, defendendo que um sujeito só será obrigado a realizar ou não uma ação se houver prévio regimento legal.

Saudações! Prepare-se para um artigo aula aqui no Portal da Aurum 🙂 

Hoje vamos navegar em um dos principais pilares do Estado Democrático de Direito e base do sistema constitucional brasileiro: o princípio da legalidade.

Não deixe se enganar achando que já sabe tudo sobre o assunto, pois existem nuances sobre sua aplicabilidade que muitos colegas advogados e operadores do direito ainda deixam passar despercebido por aí… 

A minha dica é: jamais subestime o conhecimento! Às vezes aquilo que parece ser básico no direito, faz toda diferença na prática, principalmente com relação ao estudo individualizado de princípios constitucionais. Isso porque o domínio dos princípios dessa área pode livrar você de sérios apuros processuais ao longo da carreira jurídica.

Então vem comigo, pois minha missão aqui não é esgotar o tema e enchê-lo de posicionamentos doutrinários. A intenção é trazer de forma objetiva e didática os pontos essenciais sobre o princípio da legalidade, tanto pelo ponto de vista teórico, quanto pelo viés da prática da nossa advocacia.

Vamos lá então! 😊

O que é o princípio da legalidade? 

O princípio da legalidade se trata de uma norma que representa a liberdade do cidadão brasileiro, defendendo que um sujeito só será obrigado a realizar ou não uma ação se houver prévio regimento legal.

Segundo Pedro Lenza (autor de Direito Constitucional Esquematizado) esse conceito surgiu com o Estado de Direito, opondo-se a toda e qualquer forma de poder autoritário, antidemocrático. Esse princípio já estava previsto no art. 4.º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. 

A rigor, no Direito Brasileiro, o princípio da legalidade está contemplado classicamente nos seguintes dispositivos da Constituição de 1988:

Art.5º II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

Art. 37 caputA administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (…)

Confira o que é princípio de legalidade e sua importância para profissionais da advocacia e cidadãos.
Entenda a importância do princípio da legalidade no direito.

Contudo, existem outras previsões constitucionais e inúmeras repercussões desse princípio em nosso ordenamento jurídico e abordarei as mais relevantes ao longo deste artigo. Segue o jogo!

Qual a função do princípio da legalidade? 

Como você pode ter percebido, o princípio da legalidade tem um papel organizador para garantir o bom funcionamento do Estado de Democrático de Direito. A título de exemplo, é ele que nos garante (ou deveria garantir) que a vontade do povo prevaleça sobre os caprichos e desejos de um governante.

O constitucionalista e doutrinador Bernardo Gonçalves, que foi meu professor na PUC Minas em 2011, ensina que o princípio da legalidade tem como finalidade precípua limitar o poder do Estado impedindo sua utilização de forma arbitrária (impedimento do arbítrio a partir da noção de legalidade). 

Ele que determina quais são os limites de atuação da Administração Pública e estabelece até onde vai a liberdade e autonomia da vontade dos particulares.

Vale destacar que o princípio da legalidade não se reduz ao simples cumprimento da lei em sentido estrito. Não por acaso, a Lei Federal n. 9.784/99 (Lei do Processo Administrativo), no art. 2º, parágrafo único, I, define a legalidade como o dever de atuação conforme a lei e o Direito.

Em suma, é ele que rege a obrigatoriedade de fiel cumprimento não apenas das leis formais (em sentido estrito), mas de todas as espécies de atos e instrumentos normativos que compõem o chamado bloco de legalidade.

Bloco de legalidade

CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988TRATADOS E CONVENÇÕES INTERNACIONAIS
CONSTITUIÇÕES ESTADUAIS E LEIS ORGÂNICASMEDIDAS PROVISÓRIAS
LEIS ORDINÁRIAS E COMPLEMENTARESDECRETOS LEGISLATIVOS E RESOLUÇÕES
ATOS ADMINISTRATIVOSINSTRUÇÕES NORMATIVAS DIVERSAS
PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITOCOSTUMES
Confira os instrumentos que compõem o bloco de legalidade.

Repercussões nos ramos de direito 

Agora vamos entender melhor sobre as repercussões específicas em determinados ramos do direito.

Separei aqueles que possuem interpretações bem peculiares, sobretudo para sua aplicabilidade na prática da advocacia.

Princípio da legalidade constitucional 

Quando se fala do princípio da legalidade constitucional, temos que ter em mente o comando do inciso II do art. 5.º da CF/1988, que  estabelece que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo, mestres da literatura jurídica, reforçam que, no que diz respeito aos particulares, o princípio da legalidade se apóia na afirmação de que somente a lei pode criar obrigações. Por outro lado, a inexistência de lei proibitiva de determinada conduta implica estar ela permitida.

Ou seja, no viés constitucional, está intimamente ligado às liberdades individuais, de modo que o cidadão pode fazer tudo aquilo que ele quiser, desde que a lei não proíba. 

Essa é a ideia da chamada legalidade privada, fundamentada na autonomia da vontade, sendo certo que diante do silêncio legislativo ou normativo, todo e qualquer sujeito está autorizado a fazer o que bem entender (diferente do que acontece na legalidade pública, como veremos adiante).

Ainda em análise do art. 5º II da CF/1988, o entendimento majoritário na doutrina constitucionalista é que a palavra “lei” deve ser interpretada de forma ampla, contemplando todo o bloco de legalidade que mostrei anteriormente. 

Desde que, as obrigações de fazer ou não fazer, instituídas por atos infralegais, sejam criadas dentro dos limites estabelecidos por lei. 

Por fim, vale lembrar que toda e qualquer repercussão do princípio da legalidade decorre dos parâmetros constitucionais. Para fins didáticos, vamos prosseguir destacando como esse princípio repercute em outras relevantes áreas do direito.

Princípio da legalidade administrativa 

Quando falamos de legalidade administrativa, a ideia é interpretar o princípio da legalidade sob o prisma do Direito Administrativo. Isso porque, a segunda concepção clássica da norma remete justamente à sua incidência sobre o Poder Público.

Não é por acaso que lá no art. 37 caput da Constituição de 1988, aparece topograficamente como o primeiro dentre o rol de princípios explícitos que regem a Administração Pública.

Aqui temos que ter em mente a ideia de que a Administração Pública deve se submeter à vontade popular. Mas como isso acontece? Justamente por meio do princípio da legalidade.

Se por um lado o particular pode fazer tudo aquilo que a lei não proíbe, a Administração Pública só pode fazer aquilo que a lei determina. Simples assim!

Essa é a chamada legalidade pública, fundamentada na subordinação ao texto legal, de modo que, diante do silêncio legislativo, a Administração Pública está proibida de atuar.

Alexandre Mazza, mestre, doutor e autor de livros sobre Direito Administrativo, destaca que o exercício da função administrativa não pode ser pautado pela vontade da Administração ou dos agentes públicos, mas deve obrigatoriamente respeitar a vontade da lei.

O autor ainda cita o magistério de Hely Lopes Meirelles que merece ser reproduzido

“As leis administrativas são, normalmente, de ordem pública e seus preceitos não podem ser descumpridos, nem mesmo por acordo ou vontade conjunta de seus aplicadores e destinatários, uma vez que contêm verdadeiros poderes-deveres, irrelegáveis pelos agentes públicos”.

Mas agora me diga, seria o princípio da legalidade de fato respeitado no dia a dia das inúmeras relações entre Administração Pública e particulares?

Sabendo que nem sempre isso acontece, fica a dica: atenção advogados e advogadas de plantão! É aqui que moram as variadas oportunidades de atuação jurídica nas mais diversas áreas de atuação no Direito Público.

Princípio da legalidade tributária 

Outro desdobramento importante para o estudo do princípio da legalidade na esfera tributária.

O princípio da legalidade tributária está consagrado no inciso I do art.150 da CF/1988, sendo firme ao impor a seguinte vedação: exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça (imaginem se esse comando não existisse).

Aqui é ainda maior a rigidez do princípio. Porque não só fica proibida a atuação na ausência de lei, como ainda é afastada a possibilidade de atuação discricionária no exercício das atividades de exigência de tributos, como bem destacam Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo. 

O colega colunista José Guilherme de Bem Gouvêa elaborou um conteúdo completo sobre o tema para o Portal da Aurum. Você pode conferir clicando aqui

Princípio da legalidade penal 

Vale mencionar as repercussões do princípio da legalidade no Direito Penal. 

O comando constitucional decorre do inciso XXXIX do art. 5º da CF/1988, segundo o qual: não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem a prévia cominação legal”.

Perceba que, como aqui estamos lidando com o direito à liberdade dos indivíduos, o rigor da aplicação do princípio é ainda maior. 

No caso, fica afastada até mesmo a possibilidade de atuação regulamentar do Poder Executivo, em razão da clara exigência de lei formal para definir os elementos necessários para a identificação de determinada conduta como crime.

Logo, é imprescindível que a própria lei estabeleça o que de fato será crime, bem como quais serão as penas aplicáveis.

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Princípio da legalidade é a mesma coisa que reserva legal? 

Agora que já demos aquela refrescada na memória jurídica sobre os pontos principais do tema, vamos abordar uma discussão muito pesquisada e que também enfrenta alguns diferentes posicionamentos doutrinários.

Se você está estudando para concursos públicos ou se preparando para a prova da OAB, se liga nas próximas linhas porque o tema é frequente nas “pegadinhas” das bancas avaliadoras. 😉

Diferença entre princípio da legalidade e reserva legal

Em linhas gerais, boa parte da doutrina ensina que devemos falar em “reserva legal” quando o texto constitucional exige expressamente regulação mediante lei para uma matéria específica.

Seguem alguns exemplos do que seria “reserva legal”, entre os inúmeros contidos expressamente na Constituição de 1988: 

Art. 227 § 2º A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência);

Art. 37
[…] I – os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei;  
[…] VII A lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão;

Contudo, enquanto na origem do princípio da legalidade (art. 5º II CF/1988) podemos buscar uma interpretação mais ampla da palavra “Lei”, contemplando todo o chamado bloco de legalidade, na reserva legal temos uma interpretação mais restrita e limitada à exigência de uma lei formal ou atos com força de lei.

Para facilitar o entendimento, destaco aqui alguns ensinamentos do Professor Alexandre de Moraes, para o qual: 

A legalidade estabelece a necessidade de lei elaborada, conforme as regras constitucionais do processo legislativo, a fim de que possa impor comportamentos forçados.

Para Moraes, a reserva legal incide tão somente sobre campos materiais especificados pela Constituição, de modo que: 

Se todos os comportamentos humanos estão sujeitos ao princípio da legalidade, apenas alguns estão submetidos ao da reserva da lei, que é de menor abrangência, maior densidade ou conteúdo, por exigir o tratamento de matéria exclusivamente pelo Legislativo, sem a participação normativa do Executivo.

De forma ainda mais didática, Bernardo Gonçalves explica que: 

O princípio da legalidade consiste na submissão a todas as espécies normativas elaboradas em conformidade com o processo legislativo previsto na Constituição (leis em sentido amplo), já o princípio da reserva legal incide apenas sobre campos materiais específicos (delimitados), submetidos exclusivamente ao tratamento do Poder Legislativo (leis em sentido estrito).

Resumo dos conceitos

Vamos mastigar a ideia para ninguém ficar com dúvida. É como se o princípio da legalidade fosse algo mais amplo do que a reserva legal.

De modo que, o princípio da legalidade (art. 5º II da CF/1988), pode ser satisfeito tanto pela criação de leis pela via do processo legislativo, quanto pela atuação normativa decorrente da atuação administrativa dos três poderes, a exemplo de atos infralegais expedidos conforme os limites da lei.

Já na reserva legal, por se tratar de situações específicas definidas constitucionalmente, estaremos diante de maior rigidez e densidade ou conteúdo da norma, o que exigirá lei formal ou atos com força de lei devidamente permitidos pelo texto maior.

Segue uma tabelinha bem fácil para você memorizar:

PRINCÍPIO DA LEGALIDADERESERVA LEGAL
Necessidade de lei foral, ato com força de lei ou atos expedidos nos limites da lei Necessidade de lei formal ou
atos com força de lei.
Ampla abrangênciaAbrangência reduzida
Identificado em todo bloco de legalidade Identificada em hipóteses previstas e delimitadas pelo texto constitucional
Menor conteúdo ou densidadeMaior densidade ou conteúdo
Entenda as diferenças entre o princípio da legalidade e a reserva legal.

Casos práticos do princípio da legalidade na Jurisprudência 

Para trazer a aplicação do princípio da legalidade para perto do nosso estudo, separei alguns casos práticos em que a sua aplicação adequada pelo Poder Judiciário foi fundamental para a afirmação de direitos.

Claro, como não poderia ser diferente, vou trazer exemplos dentro da minha área específica de atuação: direito das pessoas com deficiência

Caso 01

ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE CONHECIMENTO. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. CONCEITO. LEI 13.146/2015. LEI DISTRITAL N. 4.317/2009. INTERPRETAÇÃO. NÃO VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. PESSOA PORTADORA DE ANEMIA FALCIFORME. SEVERIDADE DAS MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS. GRAVES RESTRIÇÕES DE ATIVIDADES E PARTICIPAÇÃO EXPERIMENTADAS POR SEU PORTADOR. LAUDO PERICIAL. CAPACIDADE FUNCIONAL COMPROMETIDA. CONCURSO PÚBLICO. VAGAS DESTINADAS À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. PARTICIPAÇÃO ASSEGURADA AO CANDIDATO. RESSALVA. SENTENÇA CONFIRMADA. 1. Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Inteligência do Art. 2º do Estatuto da Pessoa com Deficiência. Lei n. 13.146/2015. 2. A Lei distrital n. 4.317, de 9 de abril de 2009, dispõe que a Política Distrital para a Integração da Pessoa com Deficiência compreende o conjunto de orientações normativas que objetivam assegurar o pleno exercício dos direitos individuais e sociais das pessoas com deficiência (art. 1º), bem como que na interpretação desta Lei, levar-se-á em conta o princípio da dignidade da pessoa humana, os fins sociais a que ele se destina e as exigências do bem comum? (Art. 12). 3. Levando em consideração a finalidade insculpida na Lei distrital n. 4.317/2009, bem como a amplitude do conceito de pessoa portadora de deficiência na Lei 13.146/2015, não viola o princípio da legalidade a interpretação conferida à referida Lei distrital n. 4.317/2009, de forma a abranger a pessoa portadora de anemia falciforme que apresenta severidade das manifestações clínicas e graves restrições de atividades e participação por ela experimentadas, porquanto apresenta 13 (treze) deficiências e limitações nos termos da Classificação Internacional de Funcionalidade, conforme apurado pelo laudo pericial produzido em Juízo. 4. O comprometimento da capacidade funcional do candidato em razão de eventos adversos decorrentes de sua doença denominada de anemia falciforme possibilita-lhe a participação em concurso público nas vagas destinadas à pessoa portadora de deficiência. 5. Ressalva-se que não se está a reconhecer que toda pessoa portadora de anemia falciforme é classificada como deficiente para fins de participação em concurso público nas vagas reservadas, uma vez que necessária a análise de cada caso. 6. Recurso desprovido. (TJ-DF 07037828420198070018 DF 0703782-84.2019.8.07.0018, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, Data de Julgamento: 28/10/2020, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 26/11/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)

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Neste primeiro caso, estamos diante de um recurso de apelação em que a Companhia de Desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal, (CODHAB), tentou reformar uma sentença de primeiro grau que reconheceu o direito de um homem acometido por anemia falciforme, em concorrer entre as vagas reservadas para pessoas com deficiência.

A parte apelante tentou argumentar uma suposta violação ao princípio da legalidade para derrubar a sentença, mas tal alegação foi acertadamente afastada, com a devida interpretação constitucional e sistemática do princípio da legalidade pelo TJDF, que confirmou o reconhecimento da deficiência da parte recorrida.

Caso 02 

ADMINISTRATIVO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. CONCURSO PÚBLICO. INDEFERIMENTO DE INSCRIÇÃO. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. NÃO CUMPRIMENTO DE REGRA DE ENVIO DE DOCUMENTAÇÃO ESPECÍFICA. PRESUNÇÃO DE LEGALIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL. 1. O edital de abertura do concurso público previu regras de exigência preliminar da prova da deficiência, sob pena de indeferimento da inscrição. 2. Com efeito, a exigência da documentação não fere os princípios da razoabilidade ou proporcionalidade, uma vez que a situação especial exige o cumprimento de requisito especial. Ou seja, ao se concorrer à vaga destinada a portador de deficiência, não é demais exigir o promovente do concurso, como condição de deferimento da inscrição, seja demonstrada a condição especial do candidato, em atenção aos princípios da legalidade, razoabilidade e economia. 3. Deve-se salientar que, no caso de discordância de norma editalícia, cabe o candidato interessado impugnar, à época da inscrição, o edital do concurso, caso julgue ilegal ou inconstitucional algum item, de maneira a possibilitar a Administração Pública ou o Poder Judiciário providenciar a devida correção ou injustiça. 4. Apelação desprovida. (TJ-DF 07116263920198070001 DF 0711626-39.2019.8.07.0001, Relator: HECTOR VALVERDE, Data de Julgamento: 23/10/2019, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 18/11/2019 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)

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Já neste segundo caso, estamos diante de um recurso de apelação em que um candidato com deficiência tentou reverter uma sentença que negou procedência ao pedido de deferimento de inscrição em concurso público pelo fato de não ter cumprido exigências do edital do certame.

Nessa demanda, o TJDF negou provimento ao recurso, invocando o princípio da legalidade para fundamentar que o candidato deixou de cumprir regras estabelecidas pelo edital do concurso público e que ainda deixou de impugná-las quando ainda era possível.

Perceba que o princípio da legalidade incidiu sobre o particular por força das regras do edital do concurso público, ato infralegal, mas que vincula os interessados impondo obrigações. Nesse caso, o candidato com deficiência se deu mal.

Caso 03

RECURSO INOMINADO. SERVIDOR ESTADUAL. CARGO DE TÉCNICO DE ENFERMAGEM. PRETENSÃO DE REDUÇÃO DE CARGA HORÁRIA. FILHO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. ASPECTRO AUTISTA. REDUÇÃO DA JORNADA DE CARGO ESCALONADO. REGIME 12 X 36. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE LEGISLAÇÃO MUNICIPAL. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA E ANÁLOGA. APLICAÇÃO DAS NORMAS E PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. ESTATUTO DA PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. PROTEÇÃO À CRIANÇA E AO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. DIREITO FUNDAMENTAL. APLICAÇÃO DO ART. 63 DA LEI ESTADUAL 18.419/2015. AUSÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE E AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES. RECURSO – CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR – 4ª Turma Recursal – 0002789-12.2019.8.16.0025 – Araucária – Rel.: Juíza Bruna Greggio – J. 24.08.2020) (TJ-PR – RI: 00027891220198160025 PR 0002789-12.2019.8.16.0025 (Acórdão), Relator: Juíza Bruna Greggio, Data de Julgamento: 24/08/2020, 4ª Turma Recursal, Data de Publicação: 26/08/2020)

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Neste terceiro caso, temos um Recurso Inominado, interposto pelo Estado do Paraná, em face de uma servidora pública municipal que conseguiu em primeiro grau a concessão de redução de sua jornada de trabalho, ante às necessidades de seu filho autista.

Em recurso, o Estado invocou a ofensa do princípio da legalidade, pois no município em questão inexiste norma com previsão para essa modalidade de redução de jornada. 

Neste exemplo, a Turma Recursal fez a análise do princípio da legalidade de forma sistemática harmonizando sua interpretação com outros princípios constitucionais. Dessa forma, aplicou de forma análoga a legislação estadual para garantir a proteção constitucional e dignidade da criança com deficiência.

Súmula 473 do STF – Princípio da legalidade 

Eu não poderia deixar de mencionar neste artigo a famosa súmula 473 do STF: 

A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.

Trata-se de súmula de grande aplicação prática na esfera do Direito Administrativo e que deixa claro a possibilidade da Administração Pública rever seus próprios atos ao se deparar com situações de violação ao princípio da legalidade.

Muitas vezes essa revisão administrativa pode ocorrer por força da atuação especializada e atenta do advogado que sabe como provocar a Administração Pública a rever ou revogar os atos administrativos quando necessário – sem necessidade de ir direto para via judicial.

De toda sorte, ainda que tal revisão não aconteça de ofício ou por provocação dos interessados, sempre será possível acionar o Poder Judiciário para que promova o controle de legalidade dos atos administrativos.

Exceções ao princípio da legalidade 

Já sabemos que o princípio da legalidade tem valor absoluto e perene no sistema jurídico, mas existem algumas hipóteses de exceção no texto constitucional.

Sim, são situações em que o princípio da legalidade poderá ser afastado ou mitigado. 

A Constituição Federal prevê três institutos que alteram o funcionamento regular do princípio da legalidade por meio da outorga de poderes jurídicos inexistentes em situações de normalidade: 

  • A medida provisória (art. 62 da CF); 
  • O estado de defesa (art. 136 da CF); 
  • O estado de sítio (arts. 137 a 139 da CF)

Conclusão 

Espero que tenha ficado claro que o princípio da legalidade é a base do Estado de Direito e o principal pilar do nosso sistema jurídico, sobretudo para delimitar a margem de atuação da Administração Pública, além de impor limites e obrigações nas relações particulares.

Conhecer as repercussões constitucionais do princípio da legalidade é fundamental tanto para os colegas que estão estudando e se preparando para provas de concursos públicos ou exame da OAB, quanto para os colegas advogados que precisam dar aquela turbinada nas suas petições.

Falo com propriedade, pois aqui no nosso escritório o princípio da legalidade é carta marcada nas mais diversas ações anulatórias de ato administrativo, mandados de segurança, entre outras soluções jurídicas que trabalhamos na defesa da pessoa com deficiência em demandas de concursos públicos, servidores públicos e isenções tributárias da PcD.

Espero que você tenha aproveitado esse conteúdo e que não se esqueça de invocar o princípio da legalidade sempre que necessário para fortalecer a sua prática na advocacia! 

Até a próxima!

Mais conhecimento para você

Gostou deste material? Para conhecer outras liberdades e direitos garantidos na Constituição, leia também: 

Ficou com alguma dúvida? Compartilhe com a gente nos comentários! 

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Conheça as referências deste artigo

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.

Lenza, Pedro Direito constitucional / Pedro Lenza. – 25. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2021. (Coleção Esquematizado)

Moraes, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 6ª Ed. São Paulo. Editora Atlas 2006.

Direito Constitucional Descomplicado / Vicente Paulo, Marcelo Alexandrino. – 8. Ed – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO: 2012.

Fernandes, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional / Bernardo Gonçalves Fernandes 12. ed. rev., atual, e ampl. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2020.

Mazza, Alexandre Manual de direito administrativo / Alexandre Mazza. – 8. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2018.

 


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Advogado e Empreendedor. Especialista em Direitos das Pessoas com Deficiência. Pós-Graduado em Direito Constitucional e Advocacia Previdenciária. Bacharel em Direito pela PUC Minas. Diretor -Adjunto de Direitos das Pessoas com Deficiência no Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP). CEO do...

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