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Entenda o que é imunidade diplomática e quem tem direito

Entenda o que é imunidade diplomática e quem tem direito

23 maio 2023
Artigo atualizado 25 set 2024
23 maio 2023
ìcone Relógio Artigo atualizado 25 set 2024
A imunidade diplomática é um princípio que protege os diplomatas de serem abusados, pressionados ou ameaçados no país em que estão trabalhando. É uma forma de garantir que eles possam exercer suas funções livremente, conforme estabelecido na Convenção de Viena de 1961.

Os privilégios e imunidades diplomáticas são frequentemente um assunto controverso, o que acaba despertando curiosidade e gerando debates na sociedade. Afinal, como é possível que representantes de outros países estejam isentos das leis e regras que se aplicam ao restante da população?

O tema ganha destaque nos noticiários sempre que acontecem casos emblemáticos envolvendo crimes cometidos por diplomatas em seus países de destino. Dessa forma, a polêmica costuma girar em torno dos limites de tais benefícios, em relação à proteção dos interesses internos dos Estados e de seus nacionais. 

Por serem essenciais à condução das relações internacionais, entender melhor as suas características e justificativas é de extrema importância. 

Por isso, com o objetivo de desvendar o tema, iremos examinar a imunidade diplomática neste artigo. Ao final dele, seremos capazes de dizer o que pode acontecer se um diplomata cometer um crime. 

Quer entender mais sobre esse assunto? Então, bora pra leitura!  😉 

O que é imunidade diplomática?

Podemos dizer que se trata de prerrogativa de direito internacional, que limita o grau em que funcionários de governos estrangeiros e de organizações internacionais estão sujeitos às jurisdições do Estado visitante. Essa proteção ocorre com o objetivo de garantir o exercício adequado das suas funções no exterior. 

Confira qual o seu conceito!

Dessa forma, configurando verdadeira modalidade de imunidade de jurisdição, já que restringem o direito fundamental de Estados soberanos de sujeitar representantes de outros países ao seu ordenamento jurídico. 

É uma prática que se originou na antiguidade, época em que emissários de um reino possuíam os privilégios de proteção ao levar mensagens a outros reinos, com base no caráter sagrado de seus soberanos e representantes.

Qual a regulamentação da imunidade diplomática?

É regulada por convenções internacionais, como a Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas de 1961. Ela se fundamenta na teoria do interesse da função, e sua descrição pode ser encontrada no seguinte trecho:

A finalidade de tais privilégios e imunidades não é beneficiar o indivíduo, mas, sim, a de garantir o eficaz desempenho das funções das missões diplomáticas, em seu caráter de representantes dos Estados.” 

Regulamentação da imunidade consular

Da mesma forma, a imunidade consular também é regulada pela Convenção de Viena sobre Relações Consulares de 1963. Em linhas gerais, podemos dizer que tais prerrogativas são semelhantes às dos diplomatas, mas são mais restritas em razão das diferenças de funções. 

Regulamentação para funcionários de organizações internacionais

As prerrogativas de funcionários de organizações internacionais são regidas por acordos bilaterais entre o Brasil e cada uma das organizações de que o país é membro e/ou que possui sede ou representação em território brasileiro. 

Já os funcionários da ONU e suas agências seguem:

  • Convenção sobre Privilégios e Imunidades das Nações Unidas de 1946;
  • e a Convenção sobre Privilégios e Imunidades das Agências Especializadas das Nações Unidas.

Diferenças entre imunidade diplomática e imunidade consular

Antes de falarmos sobre as diferenças, é importante distinguirmos o serviço diplomático do serviço consular. 

O diplomata é o representante do Estado em suas relações internacionais. Já o cônsul, é o responsável por oferecer aos nacionais proteção e assistência no exterior. Ou seja, o cônsul lida com assuntos de interesse privado.

Além disso, os diplomatas são enviados para trabalhar nas embaixadas e em missões diplomáticas. Por outro lado, os funcionários consulares são enviados aos consulados, que são estabelecimentos governamentais que oferecem serviços aos cidadãos de seu país no exterior.  

Embora todos os privilégios e imunidades busquem garantir independência e proteção de agentes de um Estado no exercício de suas funções no exterior,  os funcionários consulares possuem privilégios reduzidos em relação aos diplomatas.

Essas constatações são tiradas da análise das Convenções de Viena de 1961 (sobre relações diplomáticas) e de 1963 (sobre relações consulares). Como ainda ressalta o ilustre professor Francisco Rezek: 

É indiferente ao direito internacional o fato de que inúmeros países – entre os quais o Brasil – tenham unificado as duas carreiras, e que cada profissional da diplomacia, nesses países, transite constantemente entre funções consulares e funções diplomáticas. A exata função desempenhada em certo momento e em certo país estrangeiro é o que determina a pauta de privilégios. Assim, ao jovem diplomata brasileiro que atue como terceiro-secretário de nossa embaixada em Nairobi aplica-se a Convenção de 1961 – não a de 1963 -, e ele terá uma cobertura mais ampla que aquela que goza o cônsul geral do Brasil em Nova York, veterano titular de um dos postos mais disputados da carreira.” 

As prerrogativas se diferenciam por conta do tipo de atribuição que o exercício das funções de cada uma demanda. Com isso, sendo mais reduzidas aos funcionários consulares, em decorrência do caráter mais burocrático e menos exposto que o ofício impõe. 

Contudo, ainda que não possuam os mesmos privilégios e imunidades dos diplomatas, eles ainda possuem diversos direitos. É o que veremos com mais detalhes nos próximos tópicos! 😉

Privilégios e Imunidades das Missões Diplomáticas

As principais prerrogativas aplicáveis às missões diplomáticas e aos Estados acreditados são estabelecidas pela Convenção de Viena de 1961, admitida pelo Brasil a partir do decreto nº 56.435/65

Desde cedo, é importante destacarmos que as missões diplomáticas não são território estrangeiro dentro de outros países, elas apenas fazem proveito da imunidade jurisdicional.

Merecem destaque:

  • Art. 23, CV 61: isenções tributárias do Estado acreditante e do Chefe da Missão;
  • Art. 22, CV 61: inviolabilidade do local da missão, dos bens nele situados e dos meios de transporte utilizados;
  • Art. 24, CV 61: inviolabilidade dos arquivos, documentos e correspondência oficial da missão;
  • Art. 27, CV 61: obrigação do Estado acreditado de resguardar a livre comunicação da Missão para todos os fins oficiais.

Além disso, em relação às imunidades e privilégios das missões diplomáticas, entendemos que:

  • Referem-se às repartições estatais;
  • Derivam das imunidades do Estado acreditante com relação ao Estado acreditado;
  • Não se tratam de exceções à ordem jurídica do Estado acreditado.

Leia também: Entenda o que diz a convenção de genebra e suas principais características!

Privilégios e Imunidades dos Agentes Diplomáticos

Os agentes diplomáticos gozam de inviolabilidade pessoal e domiciliar. Isto é, não podem ser objeto de prisão ou detenção e, ainda, sua residência tem a mesma proteção que os locais da Missão. 

Também possuem imunidade tributária no que diz respeito aos tributos diretos (art. 23, CV 61). E, ainda, a entrada no Estado destino de objetos para uso da Missão e pessoal do agente ou de membros de sua família é livre de direitos aduaneiros e taxas (art. 36, CV 61). 

Os diplomatas também detêm de ampla imunidade de jurisdição penal, sendo ela absoluta. Isto quer dizer que, um diplomata que cometa crime no Estado destino, não poderá ser preso, processado e julgado por esse país estrangeiro. 

Os agentes diplomáticos também possuem imunidade de jurisdição civil e administrativa, que por sua vez não são absolutas. Suas restrições estabelecidas pelo art. 31, da CV 61: 

Art. 31 – 1. O agente diplomático gozará da imunidade de jurisdição penal do Estado acreditado. Gozará também da imunidade de jurisdição civil e administrativa, a não ser que se trate de: 
a) uma ação sobre imóvel privado situado no território do Estado acreditado, salvo se o agente diplomático o possuir por conta do Estado acreditante para os fins da missão;
b) uma ação sucessória na qual o agente diplomático figure, a título privado e não em nome do Estado, como executor testamentário, administrador, herdeiro ou legatário;
c) uma ação referente a qualquer profissão liberal ou atividade comercial exercida pelo agente diplomático no Estado acreditado fora de suas funções oficiais. 

Vale ressaltar, que todos os privilégios dos agentes diplomáticos em matéria civil, administrativa, penal e tributária estendem-se aos membros das respectivas famílias. 

Já os membros do quadro administrativo e técnico gozam de inviolabilidade pessoal e domiciliar, ampla imunidade de jurisdição penal, imunidade civil, administrativa e tributária. Entretanto, as imunidades civil e administrativa se aplicam exclusivamente aos atos no exercício das funções. 

Dessa forma, podemos resumir as imunidades e privilégios dos agentes diplomáticos como sendo:

  • Imunidade penal absoluta;
  • Imunidade cível, mas com exceções: imóveis particulares, causas sucessórias, reconvenções, ações de profissões liberais e atividade comercial;
  • Imunidade tributária, com exceções exceções: tributos indiretos, tarifas de serviços públicos, sobre rendimentos privados;
  • Inviolabilidade pessoal, residencial, bagagem (desde que com fins compatíveis com atividade diplomática), comunicações, veículos, arquivos e documentos.;
  • Liberação de depor como testemunha.

Privilégios e Imunidades dos Agentes Consulares

Por sua vez, os privilégios e imunidades dos agentes consulares são regulados pela Convenção de Viena sobre Relações Consulares de 1963, promulgada no Brasil pelo Decreto 61.078/1967.

Ela estabelece prerrogativas bastante parecidas às aplicáveis aos agentes diplomáticos, porém mais restritos e com maior observância à função desempenhada.

No que diz respeito à imunidade penal, os funcionários consulares não poderão ser detidos ou presos preventivamente. Exceto em caso de crime grave e em decorrência de sentença de autoridade judiciária competente (art. 43, CV 63). 

Os funcionários consulares também podem ser presos em decorrência de sentença definitiva, salvo em razão de atos praticados no exercício de suas funções oficiais. 

Assim, podemos dizer que a imunidade penal dos funcionários consulares abrange apenas os atos praticados no exercício das funções consulares. Ou seja, se um cônsul cometer um crime de homicídio, ele poderá ser preso. Já se falsificar um passaporte no exercício de seu ofício, estará amparado pela imunidade. 

Além disso, os membros de repartição consular não são obrigados a depor sobre fatos relacionados com o exercício de suas funções, nem a exibir correspondência e documentos oficiais que se refiram a eles.

Da mesma forma, a imunidade civil dos cônsules e funcionários consulares está limitada ao exercício de suas funções. No que diz respeito à imunidade tributária, ela é semelhante à que fazem jus os agentes diplomáticos, abrangendo apenas os tributos diretos (art. 36, CV 63). 

Os locais consulares são invioláveis na medida estrita de sua utilização funcional, e gozam de imunidade tributária (art. 31, CV 63). Os arquivos e documentos consulares, a exemplo dos diplomáticos, são invioláveis em qualquer circunstância e onde quer que se encontrem.

É fundamental destacarmos que os privilégios consulares não são extensíveis a suas famílias. Isso porque as imunidades outorgadas aos funcionários consulares pela Convenção de Viena de 1963 se limitam aos atos praticados no exercício de suas funções. 

O que acontece quando um diplomata comete um crime?

É importante destacarmos que os privilégios e imunidades diplomáticas de modo algum se traduzem em impunidade. Em primeiro lugar, a existência das prerrogativas não exclui a jurisdição do Estado acreditante sobre os seus próprios agentes diplomáticos e consulares. 

Ou seja, os ilícitos praticados no exterior podem ser julgados em seus Estados de origem, que também são competentes para os fatos ocorridos dentro de suas respectivas embaixadas e consulados. 

Em segundo lugar, existe o dever de o agente respeitar as leis locais, insculpido na própria Convenção de Viena, de 1961, denominado primado do direito local. Segundo ele, embora imune ao processo, o agente estrangeiro deverá observar as leis do país em que se encontra. 

A norma deriva, entre outros pontos, na cortesia e no respeito que inspiram as relações internacionais. Em termos práticos, não é porque um diplomata está imune ao processo penal que ele vai transgredir uma norma do país onde se encontra.

Além disso, a existência de privilégios e imunidades não impede que o Estado acreditado investigue, de maneira puramente informativa, atos envolvendo agentes estrangeiros. 

E, nas situações em que o diplomata viole de maneira grave ou persistente as leis locais, ele pode ser declarado persona non grata. Tal instituto é modalidade de sanção e não depende de justificativa, consistindo em informar ao Estado acreditante que o diplomata é indesejável (art. 9º, CV 61). 

Ainda, existe um processo próprio para nomeação dos chefes das missões diplomáticas (embaixadores), impondo que o Estado acreditante deverá se certificar que a pessoa pretendida para nomeação obteve o “agrément”. Ou seja, o ato unilateral por meio do qual o Estado acreditado aceita a indicação de embaixador feita pelo outro Estado. 

Por fim, há ainda a possibilidade de que o funcionário estrangeiro seja processado e julgado pelas autoridades competentes do Estado acreditado pela violação das leis locais, desde que o Estado acreditante renuncie expressamente às suas imunidades. 

Por sua vez, os agentes estrangeiros não podem renunciar às imunidades pessoais, sendo prerrogativa do Estado acreditante a exclusividade em julgá-lo ou não. 

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Perguntas frequentes sobre o tema 

O diplomata pode ser preso?

Diplomatas têm imunidade legal e, na maioria dos casos, não podem ser presos. No entanto, se cometerem crimes graves ou tiverem sua imunidade revogada pelo país anfitrião, podem ser sujeitos à prisão. Em situações normais, eles estão protegidos contra serem detidos.

Quais são as imunidades diplomáticas e consulares?

Imunidades diplomáticas e consulares são proteções especiais para diplomatas e funcionários consulares, que incluem imunidade legal, de apreensão de bens e fiscal. Essas imunidades garantem que possam realizar suas funções sem interferências legais, apreensões ou obrigações fiscais. Confira quais as peculiaridades neste artigo!

Quem pode receber uma mala diplomática?

A mala diplomática pode ser recebida por diplomatas, funcionários de embaixadas, consulados, organizações internacionais e representantes oficiais de países. Ela é usada para transportar documentos importantes e correspondências oficiais, garantindo que tudo chegue de forma segura e confidencial.

Conclusão

Ao longo do texto, vimos que os privilégios e as imunidades diplomáticas são um importante princípio de direito internacional e pilar das relações internacionais.

Elas buscam proteger os funcionários estrangeiros em países hospedeiros de possíveis perseguições e interferências indevidas, mas é inegável que o tema é controverso. Especialmente em relação à visão de impunidade e injustiça que pode transparecer aos cidadãos locais. 

Ao longo da história, não foram poucos os casos emblemáticos que ilustraram as dificuldades e ambiguidades na interpretação e aplicação dessas prerrogativas. 

Por esses motivos, defendemos que tais regras precisam ser cada vez mais claras e difundidas às suas justificações e aplicações. É o que tentamos fazer através desse texto, ainda que de forma superficial.

Em última análise, se trata de mecanismo antiguíssimo e fundamental para a promoção da diplomacia e consequentemente das relações entre países, pelo que deve ser garantida por todos os estados de direito.

Por isso, é de extrema importância que se encontre um adequado equilíbrio entre a proteção de funcionários no exterior e a necessidade de responsabilizá-los por seus atos ilícitos que possam vir a ocorrer.

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Conheça as referências deste artigo

MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional público. 10ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.
MELLO, CELSO D. DE ALBUQUERQUE. Curso de direito internacional público. 15ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.
REZEK, J.F. Direito Internacional Público – Curso Elementar, Ed. Saraiva, 8a edição, 2000
PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado. Salvador: JusPODIVM, 2018.


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Luiz Paulo Yparraguirre é Mestre pelo Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE/UFRJ), Pós Graduado em Advocacia Empresarial (PUC) e em Direito Médico e Hospitalar (UCAM). Membro da World Association for Medical Law (WAML). Sócio do...

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