A Lei de Migração (Lei n. 13.445/2017) moderniza a abordagem migratória no Brasil, substituindo o antigo Estatuto do Estrangeiro e alinhando-se aos direitos humanos. Apesar de garantir mais direitos aos migrantes, o Brasil ainda enfrenta desafios na implementação da lei, evidenciando uma lacuna entre o texto legal e a prática.
A migração é uma realidade cada vez mais presente no Brasil, tanto em razão das crises humanitárias globais quanto pela posição do país como destino de muitos migrantes latino-americanos e de outras regiões.
A Lei de Migração de 2017 representou um avanço ao estabelecer novos parâmetros para o acolhimento e a inclusão de migrantes, mas também expôs os desafios que o país enfrenta para efetivar os direitos garantidos pela norma.
Este artigo visa analisar os principais aspectos dessa legislação, além de comentar seus artigos mais relevantes e destacar os pontos que ainda precisam ser aprimorados.
Um exemplo é a criação de uma autoridade civil para tratar das questões migratórias, que foi rejeitada durante a tramitação do projeto de lei.
O que é a Lei de Migração?
A Lei de Migração brasileira foi promulgada em 2017 para substituir o Estatuto do Estrangeiro, que datava de 1980 e refletia uma visão securitária e restritiva em relação aos migrantes.
A nova lei adota uma abordagem mais humanitária, focada nos direitos humanos e na integração dos migrantes.
Ela busca garantir o acesso dos migrantes aos serviços públicos, como saúde e educação, e promover a regularização documental daqueles que já estão no Brasil.
Apesar desse avanço, a implementação prática da lei é dificultada pela falta de uma infraestrutura adequada e pela persistência de barreiras burocráticas que limitam o acesso desses direitos.
Para que serve a Lei de Migração?
A Lei de Migração tem como principal objetivo regular os fluxos migratórios e garantir a mobilidade segura e ordenada de pessoas, respeitando seus direitos fundamentais.
Além disso, a legislação visa combater a xenofobia e promover a igualdade de tratamento entre migrantes e cidadãos brasileiros.
No entanto, a implementação da lei enfrenta dificuldades, especialmente no que se refere à criação de políticas públicas de acolhimento e à superação de preconceitos estruturais que ainda afetam a inserção dos migrantes na sociedade.
A migração, que deveria ser um direito garantido pela legislação, muitas vezes esbarra em práticas discriminatórias e na falta de preparo do sistema público.
O que diz a nova Lei de Migração no Brasil?
A Lei de Migração brasileira estabelece que os migrantes têm direito à igualdade de tratamento e à não discriminação.
A legislação prevê o direito ao trabalho, à educação e à saúde em igualdade de condições com os cidadãos brasileiros. Além disso, garante a proteção a refugiados e o direito à reunião familiar.
No entanto, é importante destacar que, durante a tramitação do projeto de lei (que após aprovação foi convertido na Lei 13.445/17), houve uma significativa perda ao ser rejeitado o capítulo que previa a criação de uma autoridade civil para tratar das questões migratórias.
Esse ponto é crucial, pois a atual vinculação das políticas migratórias às autoridades policiais mantém um enfoque que ainda precisa ser superado.
Dissociar as migrações das forças policiais é um passo fundamental para transformar a migração em uma questão de direitos humanos/direitos civis e não de segurança pública.
Esse debate, que foi interrompido devido ao impacto financeiro da criação de um novo órgão, mas urge ser retomado.
O que é uma Migração Legal?
A migração legal é o processo pelo qual uma pessoa ingressa e permanece em um país de acordo com as normas estabelecidas pela legislação migratória.
No Brasil, a Lei de Migração oferece mecanismos de regularização para aqueles que entram no país sem os documentos adequados, assegurando-lhes o direito de se legalizarem e, eventualmente, usufruírem dos mesmos direitos que os cidadãos brasileiros.
No entanto, os processos de regularização podem ser demorados e burocráticos, e a ausência de políticas de acolhimento robustas limita o acesso dos migrantes aos serviços públicos essenciais.
A precariedade/falta de assistência jurídica gratuita e de serviços especializados agrava a situação, deixando muitos migrantes em situação de vulnerabilidade.
Lei de Migração comentada
Os principais artigos da Lei de Migração mostram um compromisso do Brasil com a proteção dos direitos humanos dos migrantes, mas sua aplicação ainda enfrenta barreiras estruturais.
Abaixo, comento alguns dos artigos mais relevantes:
- Artigo 3º
Estabelece os princípios da política migratória brasileira, como a universalidade dos direitos humanos e o combate à xenofobia.
Embora seja um marco importante, na prática, esses princípios ainda enfrentam desafios consideráveis, especialmente em áreas de fronteira, onde a discriminação e o preconceito contra migrantes são mais evidentes.
- Artigo 4º
Garante aos migrantes o direito à igualdade de tratamento no acesso a serviços públicos, como saúde e educação.
No entanto, há uma evidente lacuna entre o que a lei prevê e o que é efetivamente oferecido, principalmente em municípios de pequeno porte, que não possuem infraestrutura adequada para atender à demanda crescente de migrantes.
- Artigo 14º
O direito à reunião familiar é um dos pilares da legislação, mas a burocracia e a falta de clareza nos processos de obtenção de visto para familiares dificultam a implementação desse direito.
A criação de um órgão civil para tratar das questões migratórias poderia facilitar o acesso dos migrantes aos seus direitos, ao centralizar os processos de regularização e minimizar o impacto da burocracia estatal.
Desafios e Limites da Lei da Migração
A Lei de Migração brasileira representou um avanço importante, mas sete anos após sua aprovação sua aplicação ainda enfrenta vários desafios.
A falta de uma política migratória integrada e a fragmentação das responsabilidades entre os diferentes níveis de governo são alguns dos principais obstáculos.
Sabendo que a imigração traz enormes desafios para integração do imigrante à sociedade e que é no âmbito municipal e estadual que se concentram as instituições de Estado capazes de agir nessa acolhida, urge que a política migratória seja aprimorada para, em cada localidade, haver melhor atenção aos imigrantes e à sua inserção positiva na sociedade brasileira.
O processo de implementação da lei, entretanto, tem sido marcado pela falta de recursos e pela ausência de uma coordenação eficaz.
Além disso, como mencionado anteriormente, a ausência de uma autoridade civil específica para lidar com as questões migratórias mantém a migração atrelada às forças de segurança, perpetuando um viés securitário que não condiz com os princípios humanistas da legislação.
A criação desse órgão é um passo crucial para dissociar a política migratória da esfera policial e alinhar o Brasil às melhores práticas internacionais.
Conclusão
A Lei de Migração brasileira é um marco importante para a proteção dos direitos dos migrantes, mas sua implementação precisa de ajustes significativos.
A criação de uma autoridade civil para tratar das migrações e a municipalização de políticas migratórias são passos urgentes para garantir que a política migratória esteja dissociada de enfoques securitários e centrada nos direitos humanos.
Para que o Brasil cumpra os objetivos da legislação e ofereça uma verdadeira integração aos migrantes, é necessário não apenas avançar no debate sobre essa autoridade, mas também investir em políticas públicas robustas e coordenadas entre as diversas esferas de governo.
Perguntas frequentes sobre o tema
O que é a Lei de Migração?
A Lei de Migração (Lei n. 13.445/2017) é o marco normativo que regula a entrada, permanência e os direitos dos migrantes no Brasil, substituindo o antigo Estatuto do Estrangeiro.
Como a Lei de Migração protege os direitos dos migrantes?
Ela assegura direitos fundamentais, como acesso à saúde, educação, assistência jurídica e a não discriminação com base na origem ou status migratório.
Quais são as diferenças entre a Lei de Migração e o antigo Estatuto do Estrangeiro?
O antigo Estatuto focava em segurança nacional, enquanto a Lei de Migração adota uma visão humanista, priorizando os direitos dos migrantes e a integração social.
Como funciona a regularização de imigrantes no Brasil sob a nova lei?
A regularização pode ser feita por meio de pedidos de residência, refúgio ou asilo, de acordo com critérios de trabalho, estudo ou condições humanitárias.
A Lei de Migração permite deportação?
Sim, mas a deportação é regulamentada com garantias de defesa e devido processo legal, o que não existia no antigo Estatuto do Estrangeiro.
Como a Lei de Migração trata refugiados e asilados?
Ela garante proteção, assistência jurídica e acesso a serviços públicos, respeitando tratados internacionais de direitos humanos.
Quais são os crimes previstos na Lei de Migração?
A lei criminaliza a discriminação, o tráfico de pessoas e ações de xenofobia contra migrantes, impondo punições severas.
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Conheça as referências deste artigo
– SICILIANO, André Luiz. *A política migratória brasileira: limites e desafios*. Dissertação de Mestrado, Universidade de São Paulo, 2013【29†source】.
– SICILIANO, André Luiz. *O direito à migração: Migrar um verbo transitivo no antropocentrismo jurídico*. Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo, 2019【30†source】.
– OLIVEIRA, Antônio Tadeu Ribeiro de. *Migrações internacionais e políticas migratórias no Brasil*. Documento.
– CAVALCANTI, L.; PEREDA, L.; MACÊDO, M. de; TONHATI, T. “Política migratória brasileira: de la tríada apertura control selectividad a la agenda de los direitos humanos.” In: RAMÍREZ, J. *Migración, Estado y Políticas. Cambios y continuidades en América del Sur*. La Paz: Vicepresidencia do Estado Plurinacional de Bolívia, 2017.
– PATARRA, Neide L. *O Brasil: país de imigração?*. Revista e-metropolis, Observatório das Cidades, 2012.
*Autor: André Luiz Siciliano, advogado, mestre em relações internacionais, doutor em direito internacional.
Doutor em Direito Internacional (USP), Pesquisador visitante no Max Planck Institute (Göttingen/Alemanha - Depto. de Ética, Direito e Política), Mestre em Relações Internacionais (USP), advogado-sócio responsável pela área de Direito Internacional do escritório Siciliano Sociedade de Advogados, pai, interessado em...
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