Biodireito é uma área do Direito Público que visa proteger a dignidade humana e a ética na área da saúde. Ele consiste em um conjunto de regras que regulam a conduta dos profissionais médicos e científicos diante dos avanços da medicina e biotecnologia.
Com os avanços da medicina, as expressões bioética e biodireito estão se tornando comuns no dia a dia de diversas áreas, como a do direito e a da saúde.
Por isso, nesse texto vamos contextualizar o surgimento da bioética no Brasil, entender o que significa cada uma dessas ciências, os princípios por trás do biodireito, a relação com outras áreas e a importância do tema.
Ao final, você vai ter acesso a sugestões de cursos e livros para aprofundar os estudos e conhecimento na área.
Qual a origem do biodireito?
Para entender o que é biodireito, primeiro precisamos falar sobre a bioética.
A Bioética passou a ser considerada uma ciência acadêmica nos Estados Unidos, na década de 70. A partir da publicação do livro “Princípios da Ética Biomédica”, dos autores Beauchamp e Childress, responsáveis pela Teoria da Bioética Principialista.
Assim também ocorreu no Brasil com a chegada da teoria principialista. Além disso, a estruturação da bioética brasileira surgiu a partir da criação da Sociedade Brasileira de Bioética – SBB e com a Resolução n. 196/1996 do Conselho Nacional de Saúde.
A Resolução 196 determina o funcionamento da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa – CONEP, que regulamenta os Comitês de Ética em Pesquisa – CEPs.
Os CEPs têm o objetivo de avaliar as pesquisas envolvendo seres humanos. Dessa forma, é determinado no Brasil que todo projeto deve seguir os princípios e as regras éticas de pesquisas com seres humanos.
Dessa forma, a criação dos CEPs e da CONEP trouxe visibilidade para a teoria principialista, gerando a obrigatoriedade do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido em todas as pesquisas e projetos que envolvem seres humanos.
Nesse contexto, em 2016 houve a Resolução n. 510, que regulamenta as pesquisas das ciências humanas e sociais. E, em 2017, foi publicada a Resolução n. 466/2016 que norteia as pesquisas envolvendo seres humanos.
Atualmente, a matéria de bioética é obrigatória em todas as faculdades de ciências da saúde, além de ser disciplina optativa em diversos outros cursos. Isso contribui para a continuidade do estudo da bioética e o crescimento do interesse pelo estudo da matéria.
O que é biodireito?
O biodireito é uma área do Direito Público e trata da positivação jurídica do conjunto de normas ético-morais e de princípios fundamentais da bioética, voltados para a medicina e as ciências da vida.
Ou seja, é a criação de normas de permissões de comportamentos médico-científicos e sanções para os casos de descumprimento destas. Sendo que, tudo isso, serve para a impor limites e regulamentar o comportamento humano relacionado às pesquisas bioéticas, determinando o que é eticamente aceito, ou não.
Qual a diferença entre Bioética e Biodireito?
A bioética é uma matéria transdisciplinar que busca soluções para esses conflitos e dilemas éticos. Já o biodireito é a tratativa jurídica dos temas relacionados à bioética.
Os estudos da bioética envolvem a cooperação e interação de diversas outras matérias como a medicina, enfermagem, direito e filosofia. Além disso, a bioética pode ser dividida em duas esferas:
– Situações Emergentes: aquelas que estão em questão no momento atual. Ou seja, que a humanidade está tendo que lidar com elas “agora”. Sendo assim, dizem respeito a conflitos resultantes da aplicação da tecnologia em saúde, como por exemplo a fertilização in vitro, eugenia, clonagem de pessoas e animais, entre outros;
– Situações Persistentes: situações que já estão na sociedade desde os primórdios. Como, por exemplo, o aborto, o direito de morrer, a ideia de diretivas antecipadas de vontade, eutanásia, distanasia, entre outros.
Nesse contexto, a bioética busca soluções para esses conflitos e trata a tecnologia como aliada na busca da harmonia entre todas as crenças e valores. Isso por meio da busca pela utilização de todos os benefícios advindos dela.
Já o biodireito busca formas de tratar juridicamente os temas que competem à bioética. Por exemplo, o uso de células tronco, transplante de órgãos, fertilização in vitro, doação de sangue e até a judicialização da saúde.
Qual a ligação entre bioética e biodireito?
Os dois temas estão interligados porque as demandas jurídicas da saúde vão ao encontro de questões éticas/bioéticas.
O objetivo principal do biodireito é se ocupar das tecnologias aplicadas à saúde para balizar legalmente o estudo. Dessa forma, é possível concretizadas normas para o avanço científico e, ao mesmo, preservar a vida em todas as suas formas (não só a humana).
Portanto, a bioética aponta questões emergentes e sugere soluções éticas, enquanto o direito oferece soluções jurídicas aos conflitos bioéticos. Ambos visam a proteção do ser humano em sua integralidade, fixando sistema de princípios e valores que possam ser tidos como universais e vinculativos.
Ou seja, a ligação entre a bioética e direito é a busca pelo objeto em comum: o interesse sobre a vida em suas variadas dimensões; as ciências biomédicas e a tecnociência e seus reflexos no ser humano.
Quais são os princípios norteadores do Biodireito?
Os princípios do biodireito advêm dos próprios princípios da bioética. São princípios da bioética:
- Autonomia (do consentimento informado);
- Beneficência (não maleficência);
- Justiça;
- Dignidade da pessoa humana.
Os princípios da bioética e do biodireito estão presentes na Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos – DUBDH. Esta uma norma principiológica e supralegal (está “abaixo” da Constituição Federal, mas “acima” das demais leis brasileiras, se considerarmos a pirâmide de Kelsen).
Dessa forma, a DUBDH é um texto aberto e permite que cada país que a adotou combine as regras da Declaração com as próprias leis e com as normas internacionais. Portanto, o biodireito possui os seguintes princípios:
– Ligados à pessoa humana: nesse aspecto, podemos considerar os princípios da dignidade humana e os ligados aos direitos humanos;
– Sociais: aqui entram os princípios da igualdade, da equidade e da justiça;
– Ambientais: nesse caso, são tratados de princípios de proteção às gerações futuras, proteção da biosfera e biodiversidade.
É importante ressaltar que muitos dos princípios do biodireito já estão presentes na Constituição Federal e até em outros tratados internacionais.
Biodireito e sua relação com outras áreas do direito
Apesar de o direito ter diversos ramos autônomos, eles estão interligados e dificilmente são tratados separadamente ou de forma independente. Dessa forma, o biodireito também entra nessa dinâmica e pode ser relacionado à outras áreas do direito. Confira abaixo alguns exemplos.
Biodireito e o direito penal
Esta é a relação mais comum e fácil de ser constatada. Pois o direito penal estabelece a tipificação de condutas como o aborto, o exercício ilegal da profissão, a lesão corporal resultante de ato médico ou atividade cientifica, entre outras possibilidades.
Biodireito e o direito civil
Estes também possuem estreita relação. O direito civil trata de questões como direitos de personalidade – início e fim da vida, autonomia da vontade, aplicação dos direitos humanos e normas contratuais que estabelecem a responsabilidade médica/profissional.
Biodireito e as relações de consumo
A relação pode ser estreitada entendendo que serviços como, por exemplo, a inseminação artificial, são enquadrados como consumeristas, sendo regulados pelo Código de Defesa do Consumidor.
Biodireito e o direito ambiental
O biodireito vem regulamentar a aplicação de tecnologias em relação a qualquer forma de vida, não só a humana. Portanto, a relação entre a ciência e o direito ambiental trata de questões que podem trazer implicações ao ecossistema, como os Organismos Geneticamente Modificados.
Biodireito e religião
Nesse caso, trata-se de religião como fonte de conhecimento e convicções filosóficas. Dessa forma, ela pode contribuir para debates sobre questões que envolvem proibição ou liberação de determinadas técnicas científicas, desde que seja mantida a liberdade de consciência dos pesquisadores.
Aprofundando o conhecimento
Livros de biodireito
Existem dois livros básicos que são importantes para o estudo da bioética e do biodireito. São eles:
- Fundamentos do Biodireito, da autora Renata da Rocha, que aborda justamente os dilemas que falamos acima.
- Manual de Bioética e Biodireito, do Autor Edison Tetsuzo Namba, que também vai trazer as questões éticas e legais relacionadas aos conflitos que envolvem a tecnologia na área da saúde.
Conteúdos online de biodireito
Além disso, para aprender mais sobre o tema, recomendo também os canais das advogadas Luciana Munhoz e Thaís Maia. Elas compartilham conteúdo de qualidade sobre o tema no canal do YouTube Bioéticas – clique aqui para acessar. Além de no perfil do instagram @bioeticasnapratica.
Clique e confira o vídeo: O que é biodireito.
Artigo – Biodireito: uma disciplina autônoma?
Para entender um pouco melhor sobre o Biodireito como uma disciplina autônoma, confira o artigo de Fernanda Schaefer Rivabem, clicando aqui.
Curso de prós-graduação
Por fim, salientamos que o tema é autônomo e tem ganhado cada vez mais destaque. Isso porque, a tecnologia avança diariamente, especialmente no que tange às questões da vida e saúde.
Portanto, além de diversos cursos complementares, se você se interessa em se tornar especialista no ramo, pesquise também por cursos de pós-graduação. Como por exemplo: Bioética e Biodireito: Ciências da Vida, Os Novos Desafios – Poder Biotecnológico e Justiça, oferecida pela PUC-SP.
Conclusão
Diante de tudo que foi tratado, percebemos que a bioética e o biodireito não são restritos somente às áreas médica ou jurídica. Tratam-se de uma abordagem geral, podendo ser estudada por profissionais como educadores, religiosos, assistentes sociais, psicólogos, enfermeiros e outros.
Além disso, é importante ressaltar que os princípios que norteiam estas ciências, são os previstos na Constituição e nos tratados internacionais.
E é possível perceber que o avanço nos estudas das disciplinas é cada vez maior, já que atualmente possuem cursos autônomos, inclusive em nível de mestrado e doutorado.
Por fim, a bioética trata da problematização moral das questões, já o biodireito é encarregado de discutir legal e juridicamente esses problemas.
A relação entre bioética e biodireito é indiscutível, mas seus objetivos são distintos. Porque a bioética traz a ideia de moralidade, enquanto o biodireito disciplina coercitivamente o comportamento humano.
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Advogada (OAB 158955/MG) desde 2015, com escritório em Belo Horizonte/MG. Bacharela em Direito, pela Faculdade de Direito Milton Campos. Especialista em Direito Tributário, pela Faculdade Milton Campos. Especialista em Direito Médico e Hospitalar, pela Faculdade Unyleya e pelo IPDMS. Pós...
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