Asilo político é um instituto de Direito Internacional Público, que objetiva dar acolhimento ao estrangeiro perseguido por conflito de opinião política, delito de opinião ou ligado à segurança de Estado, e que não configurem crimes de direito penal comum interno.
A generosidade é um dos traços mais marcantes da raça humana, manifestando-se sob diferentes formas no decorrer da história. Uma dessas é o ato de acolhimento de pessoas perseguidas em razão de suas raças, religião, opiniões políticas, nacionalidade, etc.
Ao longo do tempo, a proteção a essas pessoas constituiu-se em verdadeiro costume internacional. Como efeito do surgimento dos Estados, surgiu também a necessidade de positivação de tal prática, estabelecendo-se o direito de asilo lato sensu, que abrange tanto o asilo diplomático quanto o asilo territorial.
O direito de asilo é amparado pela Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, aprovada pela Assembleia Geral da ONU. O documento assegura o direito de qualquer pessoa perseguida em seu país a solicitar proteção de outro Estado, mas não estabelece o dever de concessão ao pedido de asilo, o que aponta o seu caráter discricionário, embora existam controvérsias.
Neste texto você vai encontrar os traços históricos e a definição de asilo político como instituto de Direito Internacional, bem como as suas espécies e diferenças para o refúgio.
Foram diversos os exemplos de asilos políticos nos últimos anos, por isso vou apresentar aqui, resumidamente, dois desses casos emblemáticos ao final, antes das conclusões, sendo eles: Edward Snowden e Julian Assange (WikiLeaks).
Continue a leitura! 😉
O que é asilo político?
O asilo político é a proteção dada por um Estado a um indivíduo estrangeiro que passa a ser perseguido por seu próprio país.
Para explicar melhor, entenda o que é a partir da perspectiva histórica e também como é abordada na legislação.
Contexto histórico do asilo político
O “asilo” é uma herança das civilizações antigas, cujos contornos históricos foram delimitados pela própria origem da palavra: Do grego “ásilon” e do latim “asylon”, significa templo, lugar inviolável, refúgio – no sentido dicionarizado de lugar para onde se foge visando escapar de perigo.
Surgiu para o mundo ocidental na Grécia antiga, esteve presente no Império Romano e consolidou-se na Europa medieval. Porém, antes de tomar a forma como conhecemos hoje, teve o seu caráter religioso, no qual o respeito aos templos fazia dos locais lugares de proteção contra violências e perseguições e, também, o criminoso, já que beneficiava, em geral, os praticantes de crimes comuns.
A atual denominação “asilo político” se deu a partir da Revolução Francesa, junto ao desenvolvimento das ideias de liberdade e direitos individuais, época em que se iniciou a aplicação do instituto a criminosos políticos e, por outro lado, a extradição de criminosos comuns.
Isso ocorreu em razão da ampliação dos problemas populacionais e de criminalidade na época, impondo-se o crescimento da cooperação internacional no combate ao crime. O art. 120 da Constituição francesa de 1973, passou então a garantir o oferecimento pelo povo francês de asilo aos estrangeiros exilados em sua pátria.
Devido a criação das embaixadas, o instituto assumiu definitivamente o seu caráter diplomático, com base na extraterritorialidade, atribuindo-se aos embaixadores a prerrogativa de conceder asilo nos limites de sua embaixada ou residência. A partir desses fatos, passou a constituir importante instrumento internacional de proteção ao indivíduo perseguido.
Hoje podemos afirmar que o asilo se trata de instituto humanitário que objetiva dar acolhimento a estrangeiro perseguido por dissidência de opinião política. Por isso, parcela da literatura utiliza a expressão “asilo político”, entretanto representa um pleonasmo, já que todo asilo é, nos dias de hoje, político.
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Conceituação de asilo político e legislação aplicável
O asilo político pode ser conceituado como a proteção dada por um Estado a indivíduo estrangeiro que esteja sendo perseguido por seu próprio país ou por terceiro.
Essa perseguição deve ser atual e motivada, e em razão de dissidência política, delitos de opinião, ou crimes ligados à segurança do país e que não configurem crimes de direito penal comum interno. Ou seja, a salvaguarda do asilo atualmente é a perseguição política individualizada, ao contrário do que acontecia na antiguidade, quando o asilo era concedido para crimes comuns.
Para Rezek, asilo é classificado como:
o acolhimento, pelo Estado, de estrangeiro perseguido alhures – geralmente, mas não necessariamente, em seu próprio país patrial – por causa de dissidência política, de delitos de opinião, ou por crimes que, relacionados com a segurança do Estado, não configuram quebra do direito penal comum.”
Por isso, cabe ao país asilante a classificação da natureza do delito, uma vez que o Estado asilado tende a negar a natureza política dos motivos da perseguição.
É importante dizer que não existe hoje, ainda, um tratado global sobre a questão. Suas diretrizes de Direito Internacional constam da Resolução 3.212 da Assembleia Geral da ONU, e incluem:
- Os Estados têm o direito, e não o dever, de conceder asilo;
- O asilo deve ser outorgado a pessoas que sofrem perseguição;
- Sua concessão deve ser respeitada pelos demais Estados e não deve ser motivo de reclamação;
- A qualificação do delito que justifica a perseguição compete ao Estado ao qual o asilo é solicitado;
- O Estado pode negar asilo por motivo de segurança nacional;
- As pessoas que fazem jus ao asilo não devem ter sua entrada proibida pelo Estado asilante nem ser retiradas para Estado onde podem estar sujeitas a perseguição (direito de non-refoulement).
Na América Latina sua origem institucional data do Tratado de Direito Penal Internacional de Montevidéu, de 23 de janeiro de 1889. Posteriormente, o asilo ainda foi regulamentado pela Convenção sobre Asilo, VI Conferência Pan-americana de Havana, em 1928; Convenção sobre Asilo Político, VII Conferência Internacional Americana de Montevidéu, em 1933; pelo Tratado sobre Asilo e Refúgio Político de Montevidéu, em 1939; e pela Convenção sobre Asilo Diplomático, X Conferência Interamericana de Caracas, em 1954.
No Brasil, a concessão de asilo político é um dos princípios da Constituição Federal de 1988 – CF/88, em seu art. 4º, inciso X.
Por seu turno, a Lei Migração, trata da condição do asilado em seus artigos 27, 28 e 29. Merece menção o caput do art. 27, que diz:
O asilo político, que constitui ato discricionário do Estado, poderá ser diplomático ou territorial e será outorgado como instrumento de proteção à pessoa”. Logo, defere-se que praticamos por aqui tanto o asilo diplomático – característico da América Latina -, quanto o territorial.”
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Quais os tipos de asilo político?
Existem dois tipos de asilo político, são eles: asilo diplomático e asilo territorial.
O asilo diplomático, também conhecido como extraterritorial, é aquele em que o asilado tem a sua proteção em embaixadas, acampamentos militares, aeronaves e navios sobre os quais o governo que o ameace não tenha jurisdição. Em geral é concedido por autoridade diplomática no exterior, quando o estrangeiro ainda lá se encontre.
Enquanto o asilo territorial ocorre quando o requerente de asilo já alcançou o território do Estado asilante. É conhecido como a forma “perfeita e acabada” de asilo, visto que implica na permanência do asilado em território estrangeiro.
O Decreto de nº 9.199/17, que regula a Lei de Migração, aponta as definições acerca das duas espécies de asilo. Veja:
A concessão de asilo no Brasil compete ao Poder Executivo. Devendo o estrangeiro procurar a Polícia Federal e prestar declarações justificando o motivo da perseguição. O processo então será submetido ao Ministério das Relações Exteriores, que dará um parecer sobre o caso, sendo a decisão final do Presidente da República.
Concedido o asilo, o Ministério da Justiça lavrará o termo no qual fixará o prazo do asilado no país e os deveres que lhe impõe o Direito Internacional e a legislação interna em vigor.
É importante destacar que as repartições consulares não são aceitas para a concessão de asilo diplomático, e que a concessão de asilo diplomático não implica, necessariamente, a outorga de asilo territorial.
Os direitos dos asilados são praticamente os mesmos dos demais estrangeiros. Eles têm o dever de não interferir na política interna do Estado asilante.
O asilo termina com a renúncia ao benefício, a fuga do asilado e a saída do país sem autorização do governo brasileiro, importando no fim do benefício e o impedimento do reingresso na condição de asilado.
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Qual a diferença entre asilo político e direito dos refugiados?
Apesar de ambos resguardarem, em sua essência, a proteção da pessoa humana, o direito de asilo não se confunde com o direito de refúgio.
Dentre as principais diferenças, podemos citar que: enquanto o asilo decorre da perseguição ao indivíduo, o refúgio é fundamentado normalmente em uma perseguição a um grupo de indivíduos, em função de sua raça, nacionalidade ou opção política.
Além disso, o asilo é disciplinado por tratados internacionais de cunho regional, já o refúgio possui diretrizes globais elaboradas pela Organização das Nações Unidas (ONU), por meio do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), e tem como seu principal instrumento jurídico a Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados, de 1951, atualizada pelo Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados, de 1967.
Para facilitar a compreensão e assimilação das diferenças mais marcantes entre esses dois importantes institutos de Direito Internacional, veja a tabela abaixo:
ASILO | REFÚGIO |
Ato discricionário e soberano do Estado | Concessão é dever do Estado |
Não existe foro internacional específico para o tratamento de asilo. | Controle pertence a órgãos internacionais, como o ACNUR |
Motivos para concessão são políticos | Pode ser fundamentado em perseguições por motivo de raça, grupo social, religião e penúria. |
Perseguição individualizada | Perseguição atinge a um número elevado de pessoas, mais generalizado |
Nem sempre regulado por tratados | Regulado por Tratados |
Não existe foro internacional competente para o tema ou está sujeito a qualquer órgão internacional. | O tema é tratado no âmbito internacional pelo ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados |
A proteção pode se dar no território do país estrangeiro (asilo territorial) ou na embaixada do país de destino (asilo diplomático) | Em regra, a proteção se opera fora do país |
Constitutivo | Declaratório |
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Desde os primórdios é possível destacar casos emblemáticos de figuras históricas que em algum momento se valeram da concessão de asilo por outros Estados, como, por exemplo:
- Descartes que se asilou nos Países Baixos;
- Voltaire que se asilou na Inglaterra;
- Hobbes que se asilou na França.
Cada um daqueles países outorgou sua proteção a estrangeiros perseguidos em determinado período da história.
Atualmente, há uma série de casos famosos mundialmente envolvendo o instituto em questão, como os de Julian Assange e Edward Snowden, que veremos a seguir para ilustrar a importância e as complicações do tema como instrumento de proteção à liberdade e dignidade.
Caso do Julian Assange:
O australiano Julian Assange, fundador do WikiLeaks, foi o responsável pelo vazamento de milhares de informações e documentos confidenciais do governo dos Estados Unidos em 2010, especialmente sobre as guerras do Afeganistão e Iraque. Tais documentos comprovariam, entre outras coisas, a prática de crimes de guerra por tropas norte-americanas e aliadas no período.
Sua saga jurídica se iniciou quando a Suécia, em razão de uma suposta violência sexual praticada em face de duas mulheres quando visitou o país – arquivadas muitos anos depois.
Após se entregar à polícia britânica em 2012, em razão de mandado de prisão internacional, foi solto após o pagamento de fiança. Entretanto, por violar os termos da fiança acabou tendo de se abrigar junto à Embaixada do Equador, em Londres, local onde permaneceu até 2019.
Não bastasse, ao também acusado por violação aos termos do asilo, este foi revogado e permitido que a polícia londrina finalmente o detivesse na prisão de Belmarsh.
Atualmente, o jornalista e fundador da WikiLeaks permanece na prisão de segurança máxima britânica enquanto recorre de seu processo de extradição para os Estados Unidos, retomado à época pelo governo Trump.
Até então os julgamentos vêm sendo favoráveis à ordem, já tendo sido determinado o seu retorno para que seja julgado pelos supostos crimes contra o governo norte-americano, mas Assange segue tentando reverter a decisão.
Caso do Edward Snowden:
Edward Snowden, era um analista de inteligência terceirizado a serviço da NSA (National Security Agency). Os documentos divulgados por ele a tablóides como Washington Post e The Guardian, em 2013, revelaram ao mundo o alcance da espionagem americana, que violava a privacidade não só de americanos comuns, como de líderes e cidadãos estrangeiros.
Antes do vazamento, porém, Snowden fugiu para Hong Kong e pediu o status de refugiado em um escritório da ONU, bem como solicitou asilo a mais de 20 países.
Contudo, por temer ser preso em razão da pressão política americana sobre a situação, desapareceu por semanas e reapareceu em um voo a caminho de Moscou, na Rússia, quando teve concedido seu pedido de asilo temporário pelo governo de Vladimir Putin – após cerca de um mês na área de trânsito do aeroporto, por ter tido o passaporte anulado pelos EUA.
Por lá, Snowden constituiu família e seguiu trabalhando como consultor e dando videoconferências sobre tecnologia da informação, seus riscos e ameaças.
Recentemente o governo russo lhe concedeu visto de residente permanente. Os Estados Unidos seguem tentando que ele volte ao país para ser julgado criminalmente.
Conclusão
Como se pode observar, o asilo político é instituto de inegável relevância, não só para o Direito Internacional, mas para a humanidade, uma vez que objetiva livrar seres humanos de perseguições injustas em razão de questões políticas por meio de sua acolhida em outros Estados, onde poderão gozar de seus direitos mais fundamentais e, manter, deste modo, sua liberdade e dignidade.
São os motivos pelos quais divergimos de parte da doutrina e nos alinhamos a Celso Mello, Paulo Henrique Gonçalves Portela, entre outros, defendendo que o instituto possuí flagrante caráter humanitário e, portanto, sua concessão pelos Estados deveria ser obrigatória e não discricionária, acompanhando a maior proteção humana orientadora do Direito Internacional atualmente.
Contudo, a amplitude do tema e da discussão não convém a proposta do texto, que é de introduzir o assunto, tecendo uma breve explanação acerca de seus principais pontos.
Assim, neste texto você encontrou diversas das questões mais relevantes, como a origem histórica do instituto, as espécies de asilo, diferenças de asilo e refúgio, além da exemplificação com alguns casos mundialmente conhecidos.
Espero com isso ter cumprido o objetivo, trazendo um pouco de luz a esse instituto que defende direitos fundamentais tão caros à humanidade.
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Conheça as referências deste artigo
AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. 2ª ED. São Paulo: Atlas, 2011.
JUBILUT, Liliana Lyra. O Direito Internacional dos refugiados e sua aplicação no orçamento jurídico brasileiro. São Paulo, Método, 2007.
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional público. 12ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2018.
REZEK, J.F. Direito Internacional Público – Curso Elementar, Ed. Saraiva, 13a edição, 2011.
PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado. Salvador: JusPODIVM, 2018.
TÁVORA, Fabiano. Direito Internacional Público (Coleção Diplomata). São Paulo: Saraiva, 2016.
Luiz Paulo Yparraguirre é Mestre pelo Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE/UFRJ), Pós Graduado em Advocacia Empresarial (PUC) e em Direito Médico e Hospitalar (UCAM). Membro da World Association for Medical Law (WAML). Sócio do...
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