Prevista nos arts. 240 e 250 do CPP, a busca e apreensão tem como objetivo procurar veículo, objeto ou pessoa ou veículo para que se possa apresentá-lo à autoridade que determinou a busca.
Imagine a seguinte situação: você, profissional da advocacia, é contratado pela família de um indivíduo que acaba de ser preso em flagrante.
Ao deslocar até a delegacia, tem acesso ao inquérito policial e descobre que seu cliente estava andando na rua, quando de repente policiais o abordaram para averiguação, realizando a prisão. Nessa caso, a abordagem e a prisão são legais? Essa é uma das questões que buscaremos responder ao longo desse artigo.
Iremos abordar os pontos mais importantes e o funcionamento do instituto da busca e apreensão, que passou por recentes e importantes modificações em sua interpretação.
Continue a leitura para tirar suas principais dúvidas! 😉
O que é busca e apreensão?
Apesar de serem citadas como se fossem uma coisa só, a busca não se confunde com a apreensão. A busca consiste na diligência com objetivo de encontrar objetos ou pessoas.
Enquanto isso, a apreensão deve ser entendida como medida de constrição, colocando sob custódia determinado objeto ou pessoa. Assim, a busca não está vinculada a apreensão, uma pode ocorrer sem a outra. Exemplo disso é a entrega voluntária de objeto à autoridade policial.
Um ponto de atenção é que uma eventual busca pode não produzir o resultado desejado. Ou seja, pode acabar não encontrando nada a ser apreendido.
Leia sobre coação aqui no Portal da Aurum!
Natureza jurídica da busca e apreensão
Apesar de estar inserida no Código de Processo Penal no tópico das provas, a sua natureza jurídica é de meio de obtenção de prova. Nesse sentido, a busca e apreensão visa a utilização do elemento probatório no processo ou evitar o seu perecimento.
Dessa forma, trata-se, de medida de natureza eminentemente cautelar, para acautelamento de material probatório, de coisa, de animais e até de pessoas, que não estejam ao alcance, espontâneo, da Justiça.
Leia também: Medidas cautelares diversas da prisão: o que é e quais são elas?
Quais são as espécies de busca?
Conforme o art. 240 do CPP, a busca poderá ser pessoal ou domiciliar.
Busca domiciliar
Nos termos do art. 246 do CPP, a busca domiciliar é aquela realizada em residência. Bem como em qualquer compartimento habitado, ou aposento ocupado de habitação coletiva ou em compartimento não aberto ao público, no qual alguém exerce profissão ou atividade.
Todos esses locais, bem como os quartos de hotéis, motéis ou equivalentes, quando habitados, encontram-se incluídos e protegidos pela cláusula constitucional da inviolabilidade de domicílio.
Vale dizer que o automóvel não se inclui na definição legal de domicílio, razão pela qual seria equivalente à busca pessoal e não necessitaria de autorização judicial.
Os requisitos da busca domiciliar são:
- ordem judicial escrita e fundamentada, como qualquer medida cautelar restritiva de direitos (art. 5º, XI, CF);
- indicação precisa do local, dos motivos e da finalidade da diligência (art. 243, CPP);
- cumprimento durante o dia, salvo se consentida à noite, pelo morador;
- uso de força e o arrombamento somente serão possíveis em caso de desobediência, ou em caso de ausência do morador ou de qualquer pessoa no local (art. 245, §§ 3º e 4º).
Importante destacar que a nova lei de abuso de autoridade, em seu art. 22, §1º, III, criminaliza a conduta de cumprir mandado de busca e apreensão domiciliar após as 21h ou antes das 5h.
Leia também: O que é prisão em flagrante e quais os seus requisitos!
Busca pessoal
A busca pessoal é dividida em duas espécies, a por razões de segurança e a de natureza processual penal. Vamos falar mais detalhadamente sobre elas a seguir 🙂
Busca pessoal por razões de segurança
É aquela realizada em festas, boates, aeroportos, eventos, dentre outros.
Ela não encontra qualquer regulamentação pelo CPP, devendo sempre ser realizada de maneira razoável. Ou seja, sem exposição das pessoas a constrangimento e humilhações, além da observância do sexo do revistador face ao revistado.
Busca pessoal de natureza processual penal
É determinada quando há fundada suspeita de que alguém oculte consigo coisas objetos ilícitos. De acordo com o art. 244 do CPP, a busca pessoal independe de mandado nas seguintes hipóteses:
- no caso de prisão, seja ela em flagrante delito ou no cumprimento do mandado de prisão preventiva ou temporária;
- quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito;
- quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar: no cumprimento de busca domiciliar, as pessoas que se encontrem no interior da casa poderão ser objeto de busca pessoal, mesmo que o mandado não o diga de maneira expressa.
Destaca-se que caso a busca pessoal seja executada sem que haja fundada suspeita, a conduta do agente policial pode caracterizar o crime de abuso de autoridade, conforme o art. 9º, da Lei nº 13.869/19.
Como exemplo, casos em que a autoridade executa a busca tão somente para demonstrar seu poder. Sobre o termo “fundada suspeita” trazida no art. 244 do CPP, existem importantes discussões relacionadas. Veremos quais são mais adiante! 😉
Quando pode ser realizada a busca e apreensão?
As pessoas e coisas sujeitas à busca constam do rol exemplificativo do art. 240 do CPP. Nos exatos termos do art. 240, § 1º, do CPP, a busca domiciliar poderá ser realizada quando fundadas razões a autorizarem para apreender ou prender:
- pessoas;
- coisas achadas ou obtidas por meios criminosos;
- instrumentos de falsificação e objetos falsificados;
- armas, munições e instrumentos utilizados ou destinados para a prática de crime;
- objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu;
- cartas, abertas ou não, destinadas ou em poder do acusado;
- pessoas vítimas de crime;
- elementos de convicção.
Leia também: Entenda o que é e como funciona o Habeas Corpus!
Prender pessoas
Segundo o art. 243, § 1º, do CPP, caso haja ordem de prisão, constará do próprio texto do mandado de busca. No dia a dia forense, esse documento é expedido em separado da busca e apreensão.
Coisas achadas ou obtidas por meios criminosos
Coisas achadas são aquelas eventualmente encontradas e que são importantes para o desvendamento do fato. Têm, assim, vínculo probatório.
Já as coisas obtidas por meios criminosos devem ser recolhidas para evitar o enriquecimento ilícito, viabilizando também a indenização das possíveis vítimas.
Instrumentos de falsificação e objetos falsificados
É possível a apreensão dos instrumentos utilizados para a falsificação ou contrafação (imitação enganosa da verdade) e dos objetos falsificados ou contrafeitos.
Armas, munições e instrumentos utilizados ou destinados para a prática de crime
O dispositivo em análise autoriza a apreensão de:
- armas próprias: com finalidade essencial de ataque ou defesa;
- armas impróprias: não tem essa finalidade, mas podem ser usadas para isso. Como por exemplo, uma faca ou um gargalo de garrafa;
- e munições: objeto de suprimento da arma.
Esses instrumentos apreendidos devem ser periciados a fim de se verificar sua natureza e eficiência, conforme o art.175, do CPP.
Objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu
Para revelar a verdade, são infindáveis os elementos que podem servir como prova. Ou seja, que são passíveis da medida. Por exemplo:
- papéis;
- fotografias;
- roupas sujas de sangue;
- dentre outros.
Cartas, abertas ou não, destinadas ou em poder do acusado
Poderão ser apreendidas quando houver suspeita de que o conhecimento do conteúdo possa ser útil à elucidação do fato. Uma vez abertas, as cartas são documentos como outro qualquer, podendo validamente ser apreendidas sob essa circunstância.
Por outro lado, as cartas lacradas, em razão da proteção prevista no art. 5°, XII, da CF/1988, acabam instituindo a inviolabilidade do sigilo da correspondência. Por isso, não podem ser passíveis de tal medida.
A sua apreensão e interceptação não devem ser admitidas. Se isto ocorrer, a prova é flagrantemente ilícita.
Entretanto, vale destacar que o STF já admitiu a violação da correspondência dos presidiários pela administração penitenciária, sob o fundamento de que o direito ao sigilo não é absoluto, podendo ceder em circunstâncias excepcionais.
Pessoas vítimas de crime
O objetivo é restituir a liberdade daquele que a teve cerceada em razão da infração. Isso ocorre nos casos de sequestro ou cárcere privado.
Elementos de convicção
Essa é uma previsão de ordem residual, e consiste na autoridade determinar a diligência para captação de qualquer outro elemento ou constatação de evidência de natureza probatória. Como por exemplo:
- um tapete com manchas de sangue;
- um absorvente descartado que viabilize a realização de exame de DNA;
- entre outras possibilidades.
Em relação à busca e apreensão pessoal, essa pode ser realizada para apreender armas proibidas. Além disso, também se estende a todos os itens anteriores, com exceção da busca de pessoas e pessoas vítimas de crime. Isso conforme redação do art. 240, §2º, do CPP.
Leia mais sobre Direito Processual Penal aqui no Portal da Aurum!
Quem pode determinar a busca e apreensão?
Como vimos anteriormente, a busca possui duas espécies diferentes. Dessa forma, a determinação de cada uma delas se difere.
No caso da busca pessoal, essa pode ser determinada pela autoridade policial ou pelo magistrado. Ainda, ela poderá ser determinada por ofício ou a requerimento das partes.
Importante destacar que o próprio art. 6º, II, do Código Penal, prevê a possibilidade de a autoridade policial determinar, de ofício, a apreensão dos objetos que tiverem relação com a infração, após a devida liberação dos peritos.
Dessa forma, na hipótese de um homicídio, poderá o delegado determinar a apreensão dos objetos existentes na cena do crime, como:
- armas;
- roupas;
- utensílios.
Já em relação à busca domiciliar, somente o magistrado competente poderá expedir mandado respectivo. Tal fato visa consonância com o art. 5º, XI, da Constituição Federal de 1988.
O que é fundada suspeita?
Citamos esse termo brevemente no tópico das espécies de busca, agora vamos trazer com mais detalhes o seu significado, discussões e contexto na jurisprudência. 🙂
Para o Supremo Tribunal Federal:
A fundada suspeita prevista no art. 244 do CPP não pode fundar-se em parâmetros unicamente subjetivos, exigindo elementos concretos que indiquem a necessidade da revista, em face do constrangimento que causa. Ausência, no caso, de elementos dessa natureza, que não se pode ter por configurados na alegação de que trajava, o paciente, um ‘blusão’ suscetível de esconder uma arma, sob risco de referendo a condutas arbitrárias ofensivas a direitos e garantias individuais e caracterizadoras de abuso de poder 8 ”.
Ocorre que esse entendimento não era aplicado nos tribunais pátrios. Dessa forma, havendo o reconhecimento da licitude das buscas pessoais, sem que tenha havido a denominada fundada suspeita.
Diante disso, em 2022, ambas as turmas do Superior Tribunal de Justiça, firmaram teses acerca da necessidade de dados concretos e fundados, visando a realização da busca pessoal. Isso em razão que o simples nervosismo, ou aproximação com locais já conhecidos pelo tráfico, não ensejaram a denominada fundada suspeita.
Tais elementos mostram um subjetivismo não abarcado pelo art. 244 do CPP, não indicando elementos concretos para justificar a busca pessoal.
Nesse sentido, temos as seguintes jurisprudências:
Em ambos os acórdãos, firmaram-se a necessidade de parâmetros concretos para justificar a realização da busca pessoal, indicando que, elementos subjetivos sem qualquer relação com ações criminosas, não constituem fundamento idôneo a justificar a medida.
Leia também: O que é considerado cárcere privado e qual a pena – Art. 158 CP!
Conclusão
Conforme se pode observar, a busca e apreensão é um dos mais importantes. Por se tratar de meio de obtenção de provas, é utilizado diariamente pelo poder judiciário e pelas polícias em geral.
Visando assegurar ao cidadão a concretude dos seus direitos constitucionais, a exemplo da privacidade, a jurisprudência e a legislação fixaram importantes teses no sentido de excluir a subjetividade que era comum. Em especial, nos centros de menor poder aquisitivo.
Dessa forma, exige-se uma investigação mais apurada e eficiente, no sentido de combater, de forma severa, o crime organizado e os crimes em geral.
Por fim, vale destacar aos profissionais da advocacia, especial atenção às situações de prisão em flagrante decorrentes de abordagens policiais, uma vez que poderá estar diante de flagrante ilegalidade.
Mais conhecimento para você
Se você gostou deste texto e deseja seguir a leitura em temas sobre direito e advocacia, vale a pena conferir os seguintes materiais:
- Prescrição intercorrente no Novo CPC: tudo o que você precisa saber
- O que é salário de benefício, como calcular e o que diz a lei
- Carta precatória no Novo CPC: o que é e quando deve ser utilizada
- Petição inicial: como fazer, seus requisitos e principais erros [+ MODELO]
- Art 312 do CPP comentado: o que é prisão preventiva e principais características
- O que é o ato ordinatório e seus tipos: praticado, publicável e não-publicável
- Conheça os princípios do Marco Civil da Internet
- Conheça a Teoria do Direito Penal do Inimigo
- Repristinação
- Mandado de segurança: como funciona, tipos e modelo gratuito
- Tire suas dúvidas sobre honorários ad exitum (honorários de êxito)
- Confira os tipos de crimes contra a honra e saiba o que importa à defesa!
Este conteúdo foi útil pra você? Conta aqui nos comentários 😉
Assine grátis a Aurum News e receba uma dose semanal de conteúdo no seu e-mail! ✌️
Advogado Criminalista com ênfase no Tribunal do Júri e Professor do Instituto de Ensino Superior e Formação Avançada de Vitória (IESFAVI); Pós graduado em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera - Uniderp, graduado em Direito pela Universidade Jorge Amado....
Ler maisDeixe seu comentário e vamos conversar!
E o carro em poder da mulher do Cujus onde o juiz determinou União Estável com separação de bens. Ela não herda nada.
Obrigado