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Seção II – Das Cláusulas Abusivas

Art. 51 a 53
Comentado por Rodrigo Tissot
27 mar 2024
Atualizado em 2 jul 2024

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

I – impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis;

II – subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos casos previstos neste código;

III – transfiram responsabilidades a terceiros;

IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;

V – (Vetado);

VI – estabeleçam inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor;

VII – determinem a utilização compulsória de arbitragem;

VIII – imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor;

IX – deixem ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato, embora obrigando o consumidor;

X – permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral;

XI – autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja conferido ao consumidor;

XII – obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor;

XIII – autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração;

XIV – infrinjam ou possibilitem a violação de normas ambientais;

XV – estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor;

XVI – possibilitem a renúncia do direito de indenização por benfeitorias necessárias.

XVII – condicionem ou limitem de qualquer forma o acesso aos órgãos do Poder Judiciário;

XVIII – estabeleçam prazos de carência em caso de impontualidade das prestações mensais ou impeçam o restabelecimento integral dos direitos do consumidor e de seus meios de pagamento a partir da purgação da mora ou do acordo com os credores; (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)

XIX – (VETADO).

§ 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
I – ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;
II – restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual;
III – se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.

§ 2° A nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes.

§ 3° (Vetado).

§ 4° É facultado a qualquer consumidor ou entidade que o represente requerer ao Ministério Público que ajuíze a competente ação para ser declarada a nulidade de cláusula contratual que contrarie o disposto neste código ou de qualquer forma não assegure o justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes.

O artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) estabelece cláusulas contratuais consideradas nulas de pleno direito, protegendo o consumidor contra práticas abusivas.

Entre essas cláusulas estão a proibição de limitar a responsabilidade do fornecedor por danos, impedir reembolsos ao consumidor, e exigir que o consumidor seja representado por terceiros em negociações. O CDC também veda a imposição de cláusulas que permitam ao fornecedor alterar unilateralmente termos do contrato ou encerrar o contrato sem reciprocidade de direitos para o consumidor.

Além disso, cláusulas que vinculam o consumidor sem que o fornecedor seja igualmente obrigado, ou que estabelecem obrigações excessivamente desvantajosas, são consideradas nulas. O CDC também protege o consumidor contra cláusulas que infrinjam normas ambientais ou subvertam o sistema protetivo ao consumidor.

O CDC permite a redução parcial do contrato ao invalidar cláusulas abusivas, preservando as partes válidas do contrato. Ademais, o Ministério Público e entidades representativas têm legitimidade para requerer a nulidade de cláusulas abusivas em defesa dos consumidores.

Art. 52. No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o fornecedor deverá, entre outros requisitos, informá-lo prévia e adequadamente sobre:

I – preço do produto ou serviço em moeda corrente nacional;

II – montante dos juros de mora e da taxa efetiva anual de juros;

III – acréscimos legalmente previstos;

IV – número e periodicidade das prestações;

V – soma total a pagar, com e sem financiamento.

§ 1° As multas de mora decorrentes do inadimplemento de obrigações no seu termo não poderão ser superiores a dois por cento do valor da prestação. (Redação dada pela Lei nº 9.298, de 1º.8.1996)
§ 2º É assegurado ao consumidor a liquidação antecipada do débito, total ou parcialmente, mediante redução proporcional dos juros e demais acréscimos.
§ 3º (Vetado).

O art. 52 do CDC se ocupou de disciplinar o conteúdo dos contratos de consumo que estejam relacionados com produtos financeiros, como a outorga de crédito e a concessão de financiamentos. A norma foi criada para suprir a falta de informação percebida pelos consumidores no trato das relações que envolvem as instituições financeiras. 

Não raro, consumidores eram submetidos a contratos por adesão, sem que tivessem plena ciência de informações básicas a respeito dos contratos bancários, como o preço final da operação de crédito, a taxa efetiva de juros, a periodicidade da capitalização dos juros, os acréscimos legais e o número e periodicidade das prestações. 

Dessa forma, o art. 52 determina que os consumidores devem ser prévia e claramente informados sobre os itens descritos nos incisos, quais sejam, o preço do produto, o montante dos juros moratórios e a taxa efetiva anual de juros, os acréscimos legalmente previstos, o número e periodicidade das prestações, o total a pagar, com e sem financiamento. 

Diversos são os precedentes do STJ que reconhecem, por exemplo, que a informação sobre o total a pagar, com e sem financiamento, é essencial para garantir a transparência e capacidade de escolha do consumidor. O mesmo valor quanto aos demais itens acima descritos, cuja ausência poderá caracterizar a nulidade do ajuste, em favor do consumidor.

Um contrato de financiamento de automóvel, considerado o art. 52, deverá estipular, inclusive, os encargos relacionados ao IOF, taxas administrativas, preço total, juros efetivos e o número total de parcelas, bem como a sua periodicidade.

§ 1º Ao descumprir uma obrigação contratual, a parte inadimplente poderá estar sujeita à aplicação de multa moratória. Nos contratos paritários, o valor desta multa pode ser estipulada livremente pelas partes, desde que não seja manifestamente desproporcional.

O CDC, por sua vez, optou por limitar os juros moratórios a, no máximo, 2% do valor da prestação inadimplida. Trata-se de proteção clara e declarada ao consumidor, que fica “protegido” de penalidades excessivas, guardando proporcionalidade entre a penalidade e o valor inadimplido. 

Se, por exemplo, um consumidor deixar de pagar uma parcela de R$ 1.000,00 do financiamento de um automóvel, além da correção monetária e eventuais juros moratórios, o consumidor estará sujeito ao pagamento de multa moratória no valor máximo de R$ 20,00, que representam 2% do valor inadimplido. 

§ 2º O §2º do CDC garante ao consumidor o direito de liquidar antecipadamente um débito, de forma total ou parcial, com a redução proporcional dos juros e demais acréscimos. O objetivo é impedir que os consumidores fiquem vinculados aos prazos e parcelas originários na hipótese de disporem de recursos para liquidação antecipada. 

Finalisticamente, antecipar parcelas para reduzir os custos financeiros de uma operação costuma ser uma decisão financeiramente estratégica, observada a redução dos encargos na quitação antecipada. 

Trata-se de prática difundida nos financiamentos imobiliários, em que os consumidores adiantam parcelas para que haja a amortização de débitos com a redução proporcional dos juros remuneratórios e demais encargos, tornando a operação de crédito muito menos onerosa ao consumidor. O dispositivo, então, garante ao consumidor que, querendo, possa reduzir seu ônus financeiro. 

Art. 53. Nos contratos de compra e venda de móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado.

§ 1° (Vetado).

§ 2° Nos contratos do sistema de consórcio de produtos duráveis, a compensação ou a restituição das parcelas quitadas, na forma deste artigo, terá descontada, além da vantagem econômica auferida com a fruição, os prejuízos que o desistente ou inadimplente causar ao grupo.

§ 3° Os contratos de que trata o caput deste artigo serão expressos em moeda corrente nacional.

Em mais um dispositivo voltado às relações de consumo de natureza financeira, notadamente na compra e venda de imóveis ou móveis mediante parcelamento ou por alienação fiduciária em garantia, estão proibidas as cláusulas que imponham ao consumidor a perda dos valores pagos em caso de inadimplemento, na hipótese de se pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto. 

Por exemplo, havendo um financiamento de automóvel com inadimplemento, pode a instituição financeira pleitear a resolução do contrato por descumprimento. Não poderá, no entanto, ser imposta ao consumidor a perda das parcelas anteriormente pagas, caso queira a retomada do bem. É incompatível cumular a retenção dos valores pagos com a retomada do veículo, pois isso geraria um enriquecimento sem causa à instituição financeira. 

O consumidor, no caso acima, fará jus a uma restituição parcial dos valores pagos, considerando o valor do bem e as prestações adimplidas. Não há como haver perdimento total do montante pago e do próprio bem. 

§ 2º Nos contratos de consórcio, dada a sua natureza específica, que difere em parte das atividades desempenhadas pelas instituições financeiras, o encerramento da relação contratual, com a compensação ou restituição das parcelas, considerará, a título de desconto, a vantagem auferida com a fruição dos bens e o prejuízo causado ao grupo. 

Trata-se de legitimação de uma dedução que pode ser significativa para o desistente ou inadimplemente em contratos de consórcio. Ou seja, há uma camada reduzida de proteção que decorre da própria natureza do contrato, em que há dependência recíproca entre os participantes.

§ 3º O terceiro e último parágrafo do dispositivo reforça o real como moeda de circulação obrigatória. Dessa forma, os contratos relativos ao art. 53 (operações de crédito e consórcios) devem ser celebrados considerando a moeda corrente nacional, atualmente o real. 

Evita-se, neste contexto, o risco de variações cambiais em prejuízo do consumidor, como ocorrido, por exemplo, no início dos anos 2000, com contratos de financiamento indexados pelo dólar. Com o descolamento da cotação da moeda, as operações de crédito se tornaram excessivamente onerosas para os consumidores. Este é, inclusive, o caso que exemplifica a revisão de contratos por onerosidade excessiva no âmbito do direito brasileiro.

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Advogado (OAB 51419/SC). Sócio de Bertoncini, Gouvêa & Tissot Advogados, onde atua nas áreas de Direito Civil, Direito Empresarial, Direito dos Contratos, Responsabilidade Civil e Direito do Consumidor. Mestrando em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pós-graduado em...

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