O conflito de competência surge quando há a indagação de mais de um órgão judiciário ser competente para processar e julgar a mesma causa.
A competência exemplifica os limites dentro dos quais a jurisdição é exercida pelo órgão judicial, inclusive dividindo a função jurisdicional entre os vários órgãos da Justiça Nacional.
E como no Direito tudo depende, a competência também dependerá das variáveis apresentadas em cada processo, podendo originar o conflito de competência quando houver divergência sobre qual juízo deva processar e julgar o feito. É sobre esse conflito que vamos falar hoje.
Falar sobre processo civil faz arrepiar até o último fio de cabelo de muitos advogados, não é mesmo? Entender a matéria, então, nem se fala! Justamente por isso, hoje o artigo será voltado ao conflito de competência e como enfrentá-lo na prática. Continue lendo! 🙂
O que é conflito de competência?
Cada processo distribuído junto ao Poder Judiciário pertence a competência a um juiz ou tribunal. Um único processo pode passar por diversos órgãos judiciários, pelo simples grau hierárquico existente decorrente dos recursos interpostos pela parte ou por ofício, nos casos de duplo grau de jurisdição necessário (art. 496, CPC).
Sabemos que a vida útil de um processo pode chegar de 6 meses até anos e perder de vistas. Entre um recurso e outro, em busca do melhor direito ao cliente, os advogados passam dias e noites batalhando para que algum processo seja finalmente diferente e tenha uma resolução rápida.
Até aí tudo bem. O grande problema é passar anos numa briga judicial, receber decisões a respeito e, no final, descobrir que as decisões são nulas por terem sido julgadas por um juiz incompetente! Já imaginou a insegurança jurídica neste momento?
Em razão disso, quando há a indagação de mais de um órgão judiciário ser competente para processar e julgar a mesma causa, surge o conflito de competência.
A suscitação do conflito de competência é um incidente processual destinado a determinar qual será o juízo competente para a apreciação de determinado processo e está regulamentada nos arts. 66, 951 à 959 do Novo CPC.
Na prática acontece da seguinte forma: na preliminar de incompetência na contestação (art.64, CPC) ou de ofício. A partir disso, os juízes se dão por competentes ou declaram a sua incompetência para resolver o feito.
Saiba mais sobre o princípio da segurança jurídica.
Tipos de conflito de competência
Os conflitos se dividem entre positivos e negativos, com previsão expressa no Novo Código de Processo Civil.
Basicamente, quando vários juízes declaram sua competência, temos um conflito positivo. Ao contrário, quando vários juízes declaram sua incompetência, temos um conflito negativo. O art. 66 do Novo CP descreve o seguinte:
Art. 66. Há conflito de competência quando:
I – 2 (dois) ou mais juízes se declaram competentes;
II – 2 (dois) ou mais juízes se consideram incompetentes, atribuindo um ao outro a competência;
III – entre 2 (dois) ou mais juízes surge controvérsia acerca da reunião ou separação de processos.”
Para o caso do conflito positivo, basta que dois ou mais juízes pratiquem atos em causa idêntica, com prosseguimento ao processo, não sendo necessária a decisão expressa a respeito da sua própria competência ou da incompetência de outrem, segundo o pensamento de Humberto Theodoro Júnior.
Para o caso do conflito negativo, o Código impôs a reciprocidade, ou seja, além do juiz declarar sua incompetência deverá, também, atribuir a competência a outro juízo.
No caso do último inciso previsto no art. 66, temos tanto o conflito positivo quanto o negativo. No primeiro, a controvérsia será implantada quando um juiz determina a reunião do processo X e Y e contra esta reunião o juiz do processo Y se insurge por também se afirmar competente.
No segundo, quando um juiz determina a separação de processos e outro juiz, o qual um dos processos foi remetido, rejeita a competência que lhe foi atribuída.
Conflito de competência no Novo CPC
O Código de Processo Civil de 1973 previa que o conflito de competência poderia ser arguido por qualquer das partes, pelo próprio juiz ou pelo Ministério Público (art. 116), e isso se manteve inalterado com o Código de 2015.
Todavia, o parágrafo único do artigo acima referenciado teve alteração no Novo Código (p.ú. art. 951 Novo CPC), visto que o Ministério Público não será mais ouvido em todos os conflitos de competência, somente nos processos de interesse público ou social, interesse de incapaz ou litígios coletivos pela posse de terra rural ou urbana e nas demais hipóteses previstas em lei ou na Constituição Federal (arts.178 c/c 951, p.ú). Ou seja, quando atuar no processo como parte ou fiscal da lei.
No Código de Processo Civil de 1973 trazia a vedação àquele que suscitasse o conflito para oferecer exceção de incompetência (art. 117). No atual Código processualista, a vedação foi mitigada, permanecendo somente para o caso de arguição de incompetência relativa (art. 952).
Em ambos os Códigos, a parte que não arguiu o conflito poderá suscitar a incompetência (art. 952 e p.ú, CPC).
Dispõe o litigante, portanto, de dois caminhos processuais: arguição da incompetência em contestação ou apresentação de petição propondo o conflito. O que tenta o legislador é impedir que uma das partes venha a provocar suspensões processuais abusivamente por meio dos incidentes.
No caso do juiz não acolher a competência que lhe foi declinada e também não atribuir a competência a um terceiro, deverá o próprio juiz suscitar o conflito na causa (art.66, CPC).
Os artigos do Código de Processo Civil de 2015 que tratam a respeito do julgamento da suscitação se referem ao termo “relator”, o que nos remete que a competência para julgar o conflito será do Tribunal hierarquicamente superior aos juízes conflitantes, salvo nos casos previstos pela Constituição Federal, nos quais a competência será do Superior Tribunal de Justiça. Vejamos:
(CF/88) Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
I – processar e julgar, originariamente:
d) os conflitos de competência entre quaisquer tribunais, ressalvado o disposto no art. 102, I, “o”, bem como entre tribunal e juízes a ele não vinculados e entre juízes vinculados a tribunais diversos;”
Por sua vez, será competência do Supremo Tribunal Federal quando a preencher as hipóteses previstas no art. 102, I, o, da Constituição Federal:
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I – processar e julgar, originariamente:
o) os conflitos de competência entre o Superior Tribunal de Justiça e quaisquer tribunais, entre Tribunais Superiores, ou entre estes e qualquer outro tribunal;”
Nos casos de conflito entre autoridade judiciária e autoridade administrativa, o processo e julgamento observarão o regimento interno do tribunal competente (art. 959, CPC/15).
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Como suscitar conflito de competência
Como já dito anteriormente, o conflito poderá ser suscitado por qualquer das partes, pelo Ministério Público e pelo juiz. Quando de iniciativa do juiz, o incidente será por meio de ofício, e quando de iniciativa das partes ou Ministério Público se dará por meio de petição (art. 953, I e II, CPC) e, necessariamente, quaisquer dos incidentes serão acompanhados dos documentos para provar o suscitado.
Sendo o juiz suscitante, o relator do tribunal determinará a oitiva somente do suscitado, e sendo as partes ou Ministério Público suscitantes, o relator determinará a oitiva dos juízes em conflito (art. 954, CPC). Fixando, desde já, prazo para que prestem informações.
O relator poderá tomar 3 decisões diferentes:
- Determinar de ofício o sobrestamento do processo, quando se tratar de conflito positivo;
- Designar um dos juízes para resolver, provisoriamente, as medidas urgentes, em quaisquer dos conflitos;
- Julgar imediatamente, quando sua decisão se fundar em súmula do súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, do próprio tribunal ou tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência (art. 955 e p.ú.).
Não havendo julgamento de plano, e após o prazo designado para que os juízes prestem informações, será ouvido o Ministério Público, de Segunda Instância, quando deve intervir, e após o conflito será julgado.
O conflito será decidido de modo a declarar o juízo competente e da extensão da validade dos atos do juízo incompetente, remetendo-se os autos à quem se declarar competência.
Conclusão
Falar sobre conflito de competência é falar sobre um eventual atraso no processamento da demanda. Isso porque o advogado ingressa com a petição, caso o conflito seja argüido desde o início, e o processo será remetido ao Tribunal para que julgue e, somente após o julgamento do conflito, retorne ao seu processamento original.
Caso o conflito seja descoberto somente ao final da demanda, nos deparamos com a insegurança jurídica de que as decisões do feito não tenham validade sobre as partes. Baita tristeza, né?
O tema abordado hoje nos demonstra que a cada processo protocolado e distribuído cabe a competência à um magistrado ou desembargador, em casos de competência originária. Essa é a regra, ok?
No momento de distribuição do feito, a competência em determinado juízo será de acordo com as variáveis da causa apresentada e a eventual arguição de conflito deve ser utilizada com seriedade, frente à intenção do legislador de evitar suspensões processuais abusivas por uma das partes.
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Advogada. Sou especialista em Direito Contratual pela Universidade Estácio de Sá. Sócia nominal da Teixeira Camacho & Brasil Advogados e professora de cursos online. Além disso, também sou Presidente da Comissão da Jovem Advocacia da 10ª Subseção da OAB/MT e...
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Excelente artigo!!
Consegue esclarecer as dúvidas que surgiram num caso concreto!
GOSTEI DOS ASUNTO
Parabéns pelo texto excepcional, rico em detalhes muito bem elaborado, trazendo referências e exemplos práticos.