A Lei 10257, ou Estatuto da Cidade, dispõe sobre as diretrizes gerais da política urbana, regulamentando os artigos 182 e 183 da CF/88, que tratam da política de desenvolvimento urbano. A lei estabelece normas de ordem pública e de interesse social acerca do uso da propriedade urbana.
O estatuto da cidade versa acerca das normas e diretrizes gerais na execução da política urbana. Tais diretrizes estabelecem princípios de ordem pública e de interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem estar dos cidadãos, assim como o equilíbrio ambiental.
A ideia neste artigo é trazer o contexto histórico que originou a primeira aparição do Direito Urbanístico em uma Constituição brasileira, bem como pontuar seu objetivo, os principais instrumentos e os fatos que permeiam a concepção deste tema.
O que é o Estatuto da Cidade?
O título Estatuto da Cidade advém da própria Lei Federal nº 10257/01, conforme seu artigo 1º, §1º, que assim se autodenomina. Cuida a lei de cumprir o disposto nos artigos 182 e 183 da CF/88, no sentido de criar uma política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal por intermédio de diretrizes gerais constantes nessa legislação.
A criação do estatuto se deu mediante o rápido e desordenado crescimento urbano ocorrido no Brasil a partir da década de 60 e a forte tendência ao parcelamento e à distribuição inadequada de terras, que gerou transtornos e desordem na ocupação do solo.
Diante disso, surgiu a necessidade de melhorias de urbanização e saneamento, que originou até mesmo alguns movimentos sociais que reivindicavam melhorias nas políticas públicas urbanas.
Como resultado deste conjunto de fatores, a Constituição Federal de 1988 foi a primeira Constituição brasileira a prever o Direito Urbanístico, mediante a inclusão do Capítulo II que trata da Política Urbana, composto pelos artigos 182 e 183.
Apesar da presença do Capítulo II, que trata da política urbana na Constituição Federal de 1988 e faz referência à elaboração de uma lei federal que tratasse das diretrizes gerais para desenvolvimento da política urbana, a criação do Estatuto da Cidade só ocorreu alguns anos depois, em 10 de julho de 2001.
Diretrizes gerais da lei 10257
Em seu conteúdo, a lei 10.257/01 vela pela proteção ao meio ambiente de forma equilibrada e sustentável, formando um aglomerado de regras que pretendem regulamentar a ocupação e o aproveitamento do solo urbano, garantindo a função social da propriedade.
Para isso, prevê diretrizes gerais que devem ser seguidas, tais como a garantia do direito a cidades sustentáveis, a gestão democrática e a cooperação entre os governos, a iniciativa privada e os demais setores da sociedade durante o processo de urbanização, atendendo sempre ao interesse social.
Instrumentos do Estatuto da Cidade
Dentre um aglomerado de regras de aproveitamento do solo urbano, se destacam alguns instrumentos que visam garantir a função social da propriedade e princípios como o da dignidade da pessoa humana.
Os instrumentos da política urbana estão presentes no Capítulo II do Estatuto da Cidade e compreendem:
- os planos nacionais, regionais e estaduais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico social;
- planejamento das regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões;
- e talvez o mais importante: planejamento municipal, composto de diversas ferramentas de competência municipal, a exemplo do Plano Diretor.
Além disso, a lei cita instrumentos jurídicos e políticos previstos na legislação civil, tais como a desapropriação, a usucapião especial de imóvel urbano, parcelamento, edificações, tombamento e a regularização fundiária. Também estão presentes alguns institutos financeiros e tributários, como o IPTU, contribuições de melhoria e incentivos fiscais.
Os instrumentos acima elencados são mecanismos utilizados para cumprimento do objetivo maior do Estatuto da Cidade, que é regulamentar (leia-se: organizar) o uso e a ocupação do solo urbano. São os instrumentos responsáveis por cumprir as diretrizes gerais previstas no Capítulo I, fazendo-as valer na prática.
Para nós, advogados e advogadas, é importante o conhecimento das diretrizes e dos instrumentos constantes no Estatuto da Cidade, especialmente para aqueles que atuam no ramo Imobiliário, Urbanístico e Ambiental.
Logo, no Estatuto da Cidade são encontrados grande parte dos instrumentos legais utilizados no dia a dia, seja no âmbito judicial ou administrativo.
Mais liberdade no dia a dia
Diferenças entre Plano Diretor e Estatuto da Cidade
Embora o Estatuto da Cidade contemple as diretrizes gerais e os instrumentos de cumprimento dessas diretrizes, a especificidade das normas foi deixada a cargo de cada município para que fosse elaborado de modo a atender as necessidades locais e de acordo com os interesses da cidade, regulamentadas, portanto, por meio do Plano Diretor.
Como dito anteriormente, o Plano Diretor é, certamente, a mais importante ferramenta da política de urbanização brasileira.
Por ser um mecanismo de cumprimento da diretriz geral chamada de “planejamento municipal”, compete aos municípios com mais de 20 mil habitantes a elaboração do seu Plano Diretor, também conhecido como PDM (Plano Diretor Municipal) ou PDU (Plano Diretor Urbano).
O propósito do PDM é criar pilares para uma cidade equilibrada, sustentável e que promova qualidade de vida aos cidadãos, evitando a ocupação irregular e desordenada do sono, garantindo a função social da propriedade e o princípio da dignidade humana.
Saiba mais sobre a dignidade da pessoa humana e o mínimo existencial.
Em seu conteúdo, contém as regras definidas de zoneamentos, regras de uso e ocupação do solo, zonas de interesse de preservação. Em alguns municípios, o PDM pode conter anexos com plantas, desenhos, tabelas e mapas que auxiliam o entendimento da aplicação das regras urbanísticas municipais.
Aspectos importantes sobre o Plano Diretor
É relevante aos aplicadores do direito o conhecimento da existência de um Plano Diretor para cada município.
Além disso, seu conteúdo é facilmente acessado pelo site de cada Prefeitura Municipal, onde contém diversos anexos com plantas de macrozoneamento, zoneamento urbanístico, zoneamento de altura, áreas não edificantes, dentre vários outros conteúdos pertinentes.
Ademais, podem ser encontrados elementos como as regras de atividades permitidas por zona, índices de controle urbanístico, mapeamento de vias, edificações de interesse de preservação, entre outros.
Para que fique bem claro, é válido o exemplo:
Imagine que um bairro seja essencialmente residencial. Em um determinado terreno desocupado neste bairro, uma empresa pretende implantar uma fábrica de móveis.
Durante os estudos de implantação desta fábrica, será fácil a avaliação de que, em um bairro essencialmente residencial, não é permitida a implantação de uma fábrica, pois geraria extremo desconforto aos cidadãos ao redor da fábrica, seja por conta do ruído, do tráfego de caminhões em meio ao bairro residencial, etc.
A avaliação da viabilidade da construção desta fábrica só é fácil pois o PDU prevê que, nesta zona, não é permitido o exercício desta atividade empresarial.
Portanto, é importante que os advogados não só conheçam da existência do PDU, mas que tenham domínio do seu conteúdo para que possam utilizá-lo ao seu favor no exercício da advocacia.
Conclusão
Como visto, o Estatuto da Cidade cria uma política de desenvolvimento urbano que é executada com base em diretrizes gerais previstas em seu texto legal e visa regulamentar a ocupação e o uso do solo urbano.
Assim, no escopo do estatuto é possível identificar o Plano Diretor, a principal ferramenta de planejamento e desenvolvimento urbano brasileiro, cuja elaboração fica a cargo de cada município.
Ficou claro que o conteúdo do PDM é relevante aos advogados que militam nas áreas imobiliária, ambiental e urbanística. Isso porque lá são previstas as regras principais de zoneamento e viabilidade de cada município, bem como várias ferramentas utilizadas diariamente pelos advogados e que normalmente só seriam consultadas no Código Civil ou Processual Civil.
Além disso, o PDM possui anexos com plantas, desenhos, tabelas e mapas que podem ser determinantes para o atendimento da demanda de um cliente, auxiliando, assim, na atuação dos profissionais do direito.
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Advogado (OAB 31211/ES). Possuo LL.M em Direito Societário pela FGV e especialização em Direito e Negócios Imobiliários pela IBMEC-SP. Sou sócio do Aguilar Advogados Associados, escritório de advocacia que atua há 20 anos na esfera cível. Também sou membro da...
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Parabéns pelo conteúdo!
Sou estudante de Arquitetura e Urbanismo, e para a disciplina de “Cidades” foi solicitado o estudo do estatuto. Seu conteúdo é bastante rico e me auxiliou a compreender de forma menos superficial, dando-me um direcionamento para outras áreas pertinentes ao meu estudo. Muito obrigada 🙂
Boa iniciativa e felicito,que continue a publicar artigos sobre as cidades
Muito boa inciativa, todavia a coisa mais importante do Estatuto da Cidade, e os Prefeitos desconhecem o seu teor, é que as tais diretrizes são do cunho da ORDEM PÚBLICA, e que no texto foi falado apenas uma vez.
Outra coisa que o texto precisaria abordar é sobre quais critérios seriam válidos para se apurar se a função social da propriedade está sendo cumprida por seu proprietário; e, quem fiscalizaria a função social da propriedade!!!
Mas muito bom o texto…