A interpelação judicial é uma forma de comunicação em um processo legal, usada para solicitar que uma pessoa faça ou deixe de fazer algo que o requerente acredita ser seu direito.
É muito comum no dia a dia de um profissional atuante na área do direito a análise e/ou elaboração de notificações e protestos. Ocorre, que na mesma parte da lei em que disciplina esses instrumentos, há também a figura da interpelação judicial.
Você já deve ter visto, por exemplo, que para constituir um devedor em mora, em decorrência de uma obrigação sem termo é preciso realizar uma interpelação. Porém, você sabia que não é somente para isso que uma interpelação funciona?
A interpelação, além dos casos em que é exigida por lei, pode ser muito útil quando há a necessidade de alguém comunicar outra pessoa quanto à exigência de uma obrigação de fazer ou não fazer, e o mais importante, apesar de possuir semelhanças, ela não se confunde com a notificação.
Quer saber mais sobre este instrumento? Então venha descobrir abaixo de forma clara e prática as principais informações que você precisa sobre a interpelação judicial.
O que é e para que serve a interpelação judicial?
A interpelação judicial é uma medida de comunicação de manifestação de vontade que possui como finalidade dar conhecimento ao interpelado sobre a exigência do cumprimento de uma obrigação de fazer ou não fazer quanto a algo que o interpelante entende ser seu de direito.
Por ser considerada uma forma de comunicação de vontade e não uma situação contenciosa, a interpelação judicial está localizada no Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015, na parte de procedimentos de jurisdição voluntária.
Marinoni, Arenhart e Mitidiero classificam essa transmissão a pretensão do interpelante como:
o órgão jurisdicional atual simplesmente como mediador da comunicação”.
Como fazer uma interpelação judicial?
A interpelação na via judicial inicia-se com uma petição inicial direcionada ao juiz competente (conforme regra geral de competência), na qual o interpelante, além de analisar os requisitos do artigo 319 do Código de Processo Civil deve, principalmente:
- Apresentar todos os fatos e fundamentos do pedido;
- Indicar o que deseja comunicar ao interpelado e a finalidade da comunicação;
- Solicitar a intimação do interpelado para que tome conhecimento da sua manifestação de vontade.
Cabe destacar a impossibilidade de existir pedido ao juízo que vá além do desejo de mera comunicação, caso contrário, não se trataria de uma interpelação.
Recebida a petição inicial de interpelação, o juiz poderá deferir ou indeferir o pedido. No caso de indeferimento, o recurso cabível é o de apelação.
Deferido o pedido, o magistrado, de acordo com o artigo 729 do CPC, realiza a interpelação pleiteada pelo interpelante e devolve os autos a este último.
Antes do deferimento, o juiz pode ouvir o requerido se suspeitar de algum objetivo ilícito por parte do requerente ou se tiver pedido de averbação da interpelação em registro público.
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Quando cabe uma interpelação judicial?
Conforme dispõe o artigo 727 do CPC , a interpelação judicial cabe quando o interpelante possui o interesse de reclamar do interpelado a exigência de uma obrigação de fazer ou não fazer.
Todavia, é preciso citar que esta técnica processual de comunicação de vontade é cabível também quando a lei exigir tal medida, tanto para o registro quanto para a obtenção de determinado direito.
Alguns exemplos de exigências legais são:
- No caso de obrigação sem termo (sem data para cumprimento), exige-se a realização de interpelação judicial ou extrajudicial para constituir o devedor em mora (artigo 397, parágrafo único do Código Civil, Lei nº 10.406/2002);
- Para o fim de alcançar os efeitos de uma cláusula resolutiva contratual que não esteja expressa, isto é, seja tácita, se exige também a realização de interpelação judicial (artigo 474 do Código Civil);
- Outro exemplo é no caso de o vendedor querer executar uma cláusula de reserva de domínio em face do comprador. A lei determina que antes disso seja realizada a constituição do devedor em mora por meio de protesto ou interpelação judicial (artigo 525 do Código Civil).
É interessante mencionar que a figura da interpelação judicial também é vista e utilizada em outras áreas do direito. Por exemplo, no âmbito do Direito Penal (artigo 144 do Código Penal, Decreto-Lei nº 2.848/40), sendo o Código de Processo Civil utilizado de forma subsidiária.
Na área penal, a interpelação judicial é definida, conforme cita o Conselho Nacional do Ministério Público, como um:
Instrumento judicial pelo qual a pessoa faz petição dirigida ao juiz, para pedir esclarecimentos acerca da conservação e ressalva de seus direitos ou manifestar qualquer intenção de modo formal. O objetivo da interpelação é que o juiz intime o requerido, tornando, assim, presumivelmente certa a ciência, por este, da vontade ou declaração de conhecimento de quem requer a intimação(…)”.
Portanto, pode-se observar que a interpelação é utilizada de diversas formas e pode ser muito útil nas relações jurídicas.
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Qual o prazo para responder à interpelação judicial?
Em regra não há uma resposta propriamente dita e, consequentemente, não há um prazo definido para a interpelação judicial.
Isso acontece porque a interpelação é uma medida meramente comunicativa da vontade, não há oportunidade de oferecimento de defesa, uma vez que o procedimento judicial de interpelação possui como objeto somente efetivar a comunicação do requerente quanto à exigência de uma obrigação de fazer ou não que entenda como devida.
Entretanto, o requerido poderá ser ouvido pelo juiz, previamente ao deferimento da interpelação, conforme dispõe o artigo 728 do CPC, em duas hipóteses, são elas:
- Se houver suspeita de que o requerente, por meio da notificação ou do edital, pretende alcançar fim ilícito;
- Se tiver sido requerida a averbação da notificação em registro público.
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Quais os efeitos de uma interpelação judicial?
Além da comunicação e ciência do interpelado quanto à reclamação de uma ação ou omissão pelo interpelante, é possível afirmar também que a interpelação judicial pode interromper o prazo prescricional.
O artigo 202, inciso V do Código Civil (Lei nº 10.406/2002), determina que:
Portanto, nos casos em que a interpelação judicial tenha como objetivo e resultado a constituição em mora o devedor, por exemplo, ocorre a interrupção da prescrição.
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Interpelação judicial x interpelação extrajudicial:
A interpelação pode ocorrer de forma judicial ou de forma extrajudicial. O objetivo de ambas as modalidades é o mesmo: de fazer com que o interpelado tome ciência de uma exigência de fazer ou não fazer algo em virtude do que o interpelante entende ser de seu direito.
A diferença entre elas é única e exclusivamente procedimental. A interpelação judicial necessita do deferimento do juiz e é realizada por meio de uma petição inicial levada ao juízo junto com o pedido de comunicação do interpelado
Enquanto a interpelação extrajudicial não possui o órgão jurisdicional envolvido no procedimento, haja vista que o interpelante elabora a interpelação e encaminha ao interpelado via Cartório de Títulos e Documentos ou por meio dos Correios com comprovação de recebimento.
Ambas as possibilidades são úteis quando se pretende registrar o êxito na comunicação pretendida em face do interpelado ou, ainda, quando a lei exige, como, por exemplo, no caso de constituição do devedor em mora (artigo 397, parágrafo único do Código Civil, Lei nº 10.406/2002).
Vale observar que, no caso de exigência legal é preciso observar se há forma específica exigida, ou seja, se judicial ou extrajudicial.
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Interpelação judicial no novo CPC:
Antes da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil, os instrumentos de comunicação de vontade, como as notificações e interpelações, eram considerados como procedimentos cautelares específicos (artigos 867 a 873 do Código de Processo Civil, Lei nº 5.869/1973).
Naquela época, os procedimentos cautelares eram, a princípio, típicos. Ocorre que era notório a impossibilidade de a lei conseguir prever todas as hipóteses de medidas cautelares, razão pela qual o órgão jurisdicional passou a aceitar medidas cautelares atípicas, conforme cada caso concreto, à luz do poder geral de cautela.
Desse modo, o novo Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015, passou a prever de forma diferente os procedimentos cautelares. Assim, as notificações e interpelações foram realocadas para os procedimentos de jurisdição voluntária, por serem considerados instrumentos de mera comunicação de manifestações de vontade e não situações litigiosas.
Outra principal alteração é a hipótese de resposta do interpelado nos casos de interpelação judicial. Antes, o interpelado não possuía a possibilidade de defesa nos mesmos autos, de acordo com o CPC/73:
Atualmente, há possibilidade de oitiva prévia, nos mesmos autos e em duas hipóteses, conforme já mencionado anteriormente (artigo 728 do CPC/15).
Diferença entre interpelação, notificação e protesto:
A interpelação ocorre quando o interpelante busca reclamar em face do interpelado o cumprimento de uma obrigação de fazer ou não fazer.
Já a notificação é conceituada como o ato da pessoa que tiver interesse em manifestar formalmente sua vontade a outrem sobre assunto juridicamente relevante para dar-lhes ciência de seu propósito, conforme o artigo 726 do CPC (Lei nº 13.105/2015).
E o protesto é compreendido como o ato formal de prevenir responsabilidade e promover a conservação e ressalva de direitos.
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Diante de todo o conteúdo apresentado é possível concluir que a interpelação, considerada como um procedimento de jurisdição voluntária, é uma técnica processual de comunicação que já existia desde o Código de Processo Civil anterior. Além disso, se assemelha às figuras da notificação e protesto, porém com um objetivo diferente.
Conforme sua finalidade principal, é muito utilizada para constituir devedores em mora e muito eficaz na comunicação de exigência de cumprimento de obrigações de fazer ou não fazer.
A interpelação pode ser feita por meio de autorização judicial ou simplesmente de forma extrajudicial.
Saber o que é a interpelação judicial, quando cabe, como funciona, seus efeitos e outras questões trazidas é de extrema relevância para o uso correto e adequado desta medida processual.
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Conheça as referências deste artigo
ABELHA, Marcelo. Manual de Direito Processual Civil. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
DE PINHO, Humberto Dalla Bernardina. Direito Processual Civil Contemporâneo Volume 2. Processo de Conhecimento, Cautelar, Execução e Procedimentos Especiais. São Paulo: Saraiva, 2012.
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil: Volume Único. 9. ed. Salvador: Juspodivm, 2017.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: Processo de Execução e Cumprimento da Sentença, Processo Cautelar e Tutela de Urgência. 49. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, v. 2.
Advogada (OAB/PR nº 106.750). Sócia-fundadora do escritório Vieiro & Horning Advogados que atua em todo o país. Bacharela em Direito pelo Centro Universitário Curitiba - UNICURITIBA. Pós-graduada em Direito Civil e Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUCPR....
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