Nexo causal é a relação entre causa e efeito entre uma conduta e um resultado. Na responsabilidade subjetiva, é formado pela culpa genérica do agente. Já na responsabilidade objetiva, é composto pela conduta e previsão de legal da responsabilização sem culpa ou pelo exercício de atividade de risco pelo agente.
Quando tratamos de responsabilidade civil, é essencial que o ato ilícito tenha uma relação de causa e efeito com o prejuízo gerado pelo agente. O nexo causal é a interligação entre a ofensa à norma e o prejuízo sofrido.
Mas nas hipóteses de acidente de trabalho e doenças ocupacionais sofridas pelos empregados dentro de uma relação de trabalho, como funciona a responsabilidade civil do empregador?
O nexo causal e as teorias justificadoras
Quando sofremos um acidente de carro, por exemplo, é essencial que os prejuízos decorrentes tenham relação com a colisão em si, de modo que seja possível afirmar que os danos se deram em decorrência dos atos do agente contra o direito.
Nesse sentido, o nexo causal é este vínculo, ligação ou relação de causa e efeito entre uma conduta e o resultado. Ou, como explica de forma lúdica Flávio Tartuce, em sua obra Manual de Direito Civil, é um cano virtual que liga os elementos da conduta e do dano:
A composição do nexo de causalidade varia a partir do tipo de responsabilidade em que o agente está submetido:
- Na responsabilidade subjetiva o nexo causal é composto pela culpa genérica, que engloba tanto as hipóteses de culpa estrita (negligência, imprudência e imperícia) como o dolo.
- Na responsabilidade objetiva o nexo causal é composto pela conduta, junto a previsão legal de responsabilização sem culpa ou o exercício de atividade de risco.
Existem, também, três grandes teorias que justificam o nexo de causalidade, que você confere abaixo:
1. Teoria da equivalência das condições ou do histórico dos antecedentes
Esta teoria baseia-se na ideia de que todos os fatos relativos ao evento danoso geram a responsabilidade civil. É como se o dano fosse um “quebra-cabeça” que não formaria uma imagem sem que todas as peças tivessem sido postas.
Assim como levanta Flávio Tartuce, esta teoria elastece o nexo de causalidade. Isso porque imputa a responsabilidade em todos aqueles que contribuíram com uma das peças do “quebra-cabeça” do dano.
2. Teoria da causalidade adequada
Esta teoria baseia-se na ideia de que se deve identificar a possível causa que gerou o dano de forma mais significativa. A partir desta identificação, os demais fatos circunstanciais devem ter seu peso balizado proporcionalmente ao grau de relevância em comparação com a causa principal.
Esta teoria se encontra consolidada nos artigos 944 e 945 do Código Civil:
Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.
Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização.
Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.”
3. Teoria do dano direto e imediato
Por fim, esta teoria se baseia na ideia de que os atos da vítima podem interromper o nexo causal, causando a irresponsabilidade do agente, conforme explica Tartuce:
Havendo violação de direito por parte do credor ou do terceiro, haverá interrupção do nexo causal com a consequente irresponsabilidade do suposto agente. Desse modo, somente devem ser reparados os danos que decorrem como efeitos necessários da conduta do agente. Essa teoria foi adotada pelo art. 403 do CC, sendo a prevalecente segundo parcela da doutrina […]”
O nexo causal e suas excludentes
Existem algumas hipóteses conhecidas por terem o condão de afastar o nexo de causalidade aparente, são as chamadas excludentes de nexo de causalidade:
- Culpa exclusiva da vítima
- Culpa exclusiva de terceiro
- Fato fortuito ou força maior
É importante mencionar que embora sejam excludentes, seu alcance e efeitos devem ser analisados caso a caso. A culpa exclusiva da vítima e de terceiro, como o nome sugere, implicam a inexistência de culpa concorrente com o agente. Caso haja culpa concorrente entre o agente, a vítima ou terceiro, o nexo de causalidade resta apenas parcialmente excluído – o que implicaria em uma redução no valor da indenização (teoria da causalidade adequada).
Da mesma forma, o fato fortuito/força maior não poderia ser aplicado nos casos em que envolvem atividade de risco. Como exemplo é possível citar os casos em que um avião cai em decorrência de problemas meteorológicos. Nesse sentido, dispõe o Enunciado nº 443 da V Jornada de Direito Civil:
O caso fortuito e a força maior somente serão considerados como excludentes da responsabilidade civil quando o fato gerador do dano não for conexo à atividade desenvolvida”
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O acidente de trabalho nas relações de emprego
O acidente de trabalho é conceituado pelo artigo 19 da Lei 8.213/13, como sendo aquele “que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho”.
As doenças do trabalho e as doenças profissionais são equiparadas ao acidente de trabalho pelo artigo 20 da Lei 8.213/91. Além destes, também são equiparáveis ao acidente de trabalho:
I – o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação;
II – o acidente sofrido pelo segurado no local e no horário do trabalho, em consequência de:
a) ato de agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de trabalho;
b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao trabalho;
c) ato de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de companheiro de trabalho;
d) ato de pessoa privada do uso da razão;
e) desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior;
III – a doença proveniente de contaminação acidental do empregado no exercício de sua atividade;
IV – o acidente sofrido pelo segurado ainda que fora do local e horário de trabalho:
a) na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa;
b) na prestação espontânea de qualquer serviço à empresa para lhe evitar prejuízo ou proporcionar proveito;
c) em viagem a serviço da empresa, inclusive para estudo quando financiada por esta dentro de seus planos para melhor capacitação da mão de obra, independentemente do meio de locomoção utilizado, inclusive veículo de propriedade do segurado;
d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado.
§ 1º Nos períodos destinados a refeição ou descanso, ou por ocasião da satisfação de outras necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante este, o empregado é considerado no exercício do trabalho.”
Acidentes de trabalho no Brasil
Conforme reportagem do Portal A Tarde, o Brasil ocupa a quarta posição no ranking de acidentes de trabalho. A Previdência Social registra por ano cerca de 700 mil casos, e, segundo dados do Observatório Digital de Segurança e Saúde do Trabalho, o país chega a contabilizar uma morte por acidente em serviço a cada três horas e 40 minutos.
Das ocupações associadas aos óbitos, a categoria do trabalhador agropecuário é a com mais eventos, respondendo por 9,8%. Em seguida vem: motorista de caminhão, técnico de enfermagem, servente de obras, pessoal de linha de produção, faxineiro, enfermeiro, ajudante de motorista, pedreiro e mecânico.
Além disso, conforme explica a Equipe Executiva do Programa Trabalho Seguro, “os acidentes de trabalho geram custos também para o Estado. Incumbe ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS administrar a prestação de benefícios, tais como auxílio-doença acidentário, auxílio-acidente, habilitação e reabilitação profissional e pessoal, aposentadoria por invalidez e pensão por morte. Estima-se que a Previdência Social gastou, só em 2010, cerca de 17 bilhões de reais com esses benefícios”.
Dessa forma, os acidentes de trabalho representam, além de uma questão de saúde pública, um problema de gasto público. É insustentável, em todos os aspectos, para o Estado permanecer inerte frente a realidade dos acidentes de trabalho no Brasil. A prevenção e o combate aos acidentes de trabalho devem ser prioridade nas políticas públicas.
Como funciona o nexo causal na responsabilidade civil do empregador?
Embora seja incumbido ao Poder Público, por meio do INSS, conceder e acolher os trabalhadores que sofreram algum tipo de acidente de trabalho, a responsabilidade civil pelos acidentes recai sobre o Empregador.
Quando tratamos da figura de acidente de trabalho isolado, o nexo de causalidade deve ser composto pela culpa genérica do empregador, conforme o artigo 7º, XXVIII, da Constituição Federal. Pode ser fruto do não fornecimento dos equipamentos de proteção individual ou treinamentos adequados aos seus empregados, por exemplo.
Já nos casos em que o empregador exerce atividade de risco, o nexo causal deve ser composto apenas pela conduta e a constatação do perigo da atividade desempenhada pelo empregado. É o que estabelece o Tema nº 932 do Supremo Tribunal Federal, com base no artigo 932 do Código Civil.
A caracterização da atividade de risco, entretanto, permanece sendo algo de cunho subjetivo, conforme se verifica das próprias divergências de votos no Tribunal Superior do Trabalho.
Caracterização do nexo causal pelo grau de probabilidade de ocorrência
O que se observa é que sua caracterização é definida pelo grau de probabilidade de ocorrência de acidentes de trabalho:
Exemplo 1
Considera-se de risco, para fins da responsabilidade civil objetiva prevista no art. 927, parágrafo único, do Código Civil, as atividades que expõem os empregados a uma maior probabilidade de sofrer acidentes, comparando-se com a média dos demais trabalhadores”
(Sebastião Geraldo de Oliveira, in Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional, 5.ª Edição, São Paulo: LTr, 2009, pág. 118)
Comunga-se com o entendimento adotado pelo Min. Maurício Godinho Delgado, no julgamento do RR-23400-52.2006.5.04.0404, DEJT de 26/11/2010, no sentido de que nos casos em que o risco ao qual se expõe o trabalhador, em razão de sua função (no presente caso, em decorrência do desenvolvimento de suas atividades no cumprimento do contrato de trabalho) é muito maior do que o vivenciado pelo homem médio, mostra-se possível a aplicação da responsabilidade civil objetiva do empregador. RR – 141600-25.2005.5.15.0120
Caracterização do nexo causal pelo dano ambiental do trabalho
Há uma parcela da doutrina que traz outro posicionamento interessante acerca da responsabilidade objetiva em casos de acidente de trabalho, incluindo, como hipótese de constituição de nexo de causalidade, o dano ambiental do trabalho, conforme explica Guilherme Guimarães Feliciano:
Nesses termos, pode-se distinguir, nos lindes da infortunística do trabalho, os danos decorrentes de causalidade sistêmica (que representam a concreção de um quadro de desequilíbrio na disposição ou na combinação dos fatores de produção, i.e., da poluição labor-ambiental) e os danos decorrentes de causalidade tópica (i.e., sem relação com algum desequilíbrio sistêmico do meio ambiente do trabalho). No primeiro caso, a responsabilidade civil patronal rege-se pela norma do artigo 14, §1º, da Lei 6.938/81. No segundo caso, a responsabilidade civil patronal rege-se pela norma do artigo 7º, XXVIII, da CRFB.”
Exemplo 1
Os acidentes de trabalho podem ter o mesmo tratamento jurídico dos danos ambientais, uma vez que o meio ambiente, em sua definição, também inclui o ambiente de trabalho pelo artigo 200, VIII, da Constituição Federal, nos próprios termos do Tema nº 320 do STF, anteriormente citado:
É amplo o conceito de meio ambiente adotado pela Constituição, ‘nele compreendido o do trabalho’ (CR/88, arts. 200-VIII), noção que se articula com o direito social fundamental do trabalhador à “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança” (CR/88, art. 7º-XXII). Em decorrência dessa especial proteção, as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente, nos termos do art.225-§3º da Constituição, ‘sujeitarão os infratores a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados’.”
Dessa forma, conclui-se que os danos que advém de uma condição de poluição, aqui entendida como “os danos pessoais que tendem a afetar diversos trabalhadores, todos sujeitos às mesmas condições agressivas”, devem ensejar na responsabilização objetiva do empregador nos termos do artigo 14, §1º, da Lei 6.938/81, ainda que tal atividade desempenhada pelo empregador não apresente, quantitativamente, um risco acentuado ao trabalhador em comparação com outras atividades hipotéticas.
Exemplo 2
É possível encontrar precedentes dos Tribunais Regionais do Trabalho utilizando tal posicionamento acerca da responsabilização objetiva por danos relacionados ao dano ambiental do trabalho:
Inicialmente, a respeito da alegação de inexistência de culpa da ré, registro que a responsabilidade civil subjetiva, que depende da culpa ou dolo do empregador (art. 7º, XXVIII, da CRFB/88 e art. 927 do CC)é passível de ser aplicada apenas aos acidentes do trabalho que não envolvem dano ao meio ambiente, situação não verificada em concreto. Quando o acidente guarda nexo de causalidade com uma lesão ao meio ambiente do trabalho, como na hipótese versada, é aplicável o disposto no art. 225, § 3º, combinado com o art. 200, VIII, e 170, VI, todos da CRFB/88. A responsabilidade civil, nesse caso, é objetiva e independe de culpa, conforme dispõe o art. 14, §§ 1º e 5º, da Lei nº 6.938/81, que foi recepcionado pela Constituição vigente (§ 5º incluído pela Lei nº 11.284/2006). Portanto, a responsabilidade da empregadora é objetiva neste caso, bastando a ocorrência do evento e o dano daí advindo para que lhe seja atribuída a obrigação de indenizar.”
(TRT-12 – RO: 00003786920135120024 SC 0000378-69.2013.5.12.0024, Relator: JORGE LUIZ VOLPATO, SECRETARIA DA 1A TURMA, Data de Publicação: 27/10/2015)
Exemplo 3
Na concepção abaixo, o nexo de causalidade em acidente de trabalho se elastece, englobando também a hipótese de o dano ser decorrente de questões atinentes ao meio ambiente do trabalho, de maneira geral.
Por fim, não se pode olvidar, ainda, que nas atividades em que não há exposição a risco acentuado, sustento a PRESUNÇÃO DE CULPA DO EMPREGADOR, com a correspondente inversão do ônus da prova, incumbindo a este demonstrar a total adoção das medidas de segurança e saúde do trabalho atreladas aos deveres anexos ao contrato de trabalho ou excludentes legais de sua responsabilidade. E mais, tratando-se de DANO AMBIENTAL DO TRABALHO, a responsabilidade da reclamada, por aplicação do art. 225, parágrafo terceiro, da Constituição Federal e do parágrafo 1º, do art. 14, da Lei nº 6.938/81, é este posicionamento se justifica tendo em OBJETIVA. vista que é dever precípuo do empregador promover a proteção à saúde, segurança e higidez do empregado no meio ambiente de trabalho, incluindo-se, ainda, sua higidez psíquica.”
(TRT-15 – MS: 00052378020175150000 0005237-80.2017.5.15.0000, Relator: JOSE CARLOS ABILE, 2ª Seção de Dissídios Individuais, Data de Publicação: 25/04/2017)
Conclusão
O nexo causal é a relação de causa efeito necessária entre o dano e a conduta do agente. Na responsabilidade subjetiva, o nexo causal é formado pela culpa genérica do agente. Enquanto isso, na responsabilidade objetiva, é composto pela conduta e a previsão de legal da responsabilização sem culpa ou pelo exercício de atividade de risco por parte do agente.
Dentro das relações de emprego, o nexo de causalidade do acidente de trabalho pode ser constituído:
- Pela culpa genérica, nos termos do artigo 7, XXVIII, da CF, nos casos de acidente de trabalho isolado ou;
- Pela conduta, nos casos de atividade de risco desenvolvidas pelo empregador.
Há, por fim, parte da doutrina e da própria jurisprudência que aplica a responsabilidade objetiva, também, nos casos de dano ambiental do trabalho, caracterizado pelos danos sistêmicos ao ambiente de trabalho que afetam um grupo todo de trabalhadores. Assim, acrescentando também a hipótese da natureza ambiental do dano como hipótese de constituição de nexo de causalidade no acidente de trabalho.
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Advogada (OAB 223.306/RJ), com especialização em Direito Privado e mestrado em Direito Econômico e do Desenvolvimento. Sou membro da Comissão de Empreendedorismo Jurídico e da Comissão de Startup e Inovação da OAB Seccional Barra da Tijuca/RJ. Em meu escritório presto...
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