Nome social é o nome que pessoas transgêneros e travestis preferem ser chamadas, e possui a mesma proteção concedida ao nome de registro. É assegurado pelo Decreto 8727/16.
O nome é uma característica importantíssima na vida dos seres humanos, afinal, é o elemento que primeiro nos diferencia e identifica. É pelo nome que nos apresentamos, somos chamados ou referidos e que consta em todos os nossos documentos pessoais.
Todas as pessoas têm o direito de serem registradas com um nome, que é considerado, desde o advento do Código Civil de 2002, um direito da personalidade.
Aliás, trata-se de um direito e um dever ao mesmo tempo. Afinal, o nome é, também, de interesse coletivo e social. Pessoas que cometem crimes, por exemplo, serão procuradas e processadas por seu nome.
Características do nome
O nome, a teor do Código Civil Brasileiro, é o conjunto de prenome e sobrenome. O meu, por exemplo, é Luíza (prenome) Oliveira Mascarenhas Cançado (sobrenomes ou apelidos de família).
Com toda a importância que carrega, o nome goza de grande proteção legislativa. Ninguém pode se utilizar do nome de outra pessoa sem sua autorização.
Ademais, como um direito da personalidade, o nome é irrenunciável, intransferível, indisponível, imprescritível e despido de valor patrimonial.
E quem não reconhece o próprio nome?
Ocorre que algumas pessoas não gostam de seu nome de registro ou, mais do que não gostar, não se identificam com o nome que lhes foi dado. Isso acaba se tornando um grande problema na vida destes indivíduos já que, sendo uma característica tão importante e reforçada no cotidiano, fica difícil ignorar o próprio nome.
A pessoa pode simplesmente não gostar do nome por ser de difícil pronúncia ou excessivamente criativo. Em outros casos, o nome em si pode trazer algum constrangimento ou não guardar semelhança com os demais elementos da personalidade daquela pessoa. Um exemplo é quando um nome usualmente utilizado para homens tenha sido dado a uma mulher.
A não identificação pessoal com o nome, por qualquer motivo que seja, acaba gerando muito prejuízo para autoestima e para vida da pessoa em sociedade já que a legislação estabelece que, em princípio, o nome é imutável (art. 58, Lei de Registros Públicos).
Para resolver o problema de forma mais simples, essas pessoas acabam adotando nomes sociais que nada mais são que nomes que preferem ser chamadas no cotidiano.
Nome social para pessoas transgêneros
A sociedade sempre aceitou que as pessoas se valham de nomes sociais, espécies de apelidos ou pseudônimos, utilizados em substituição ao nome de registro, sem necessidade de efetiva alteração do nome registral.
Inclusive, os nomes sociais gozam da mesma proteção concedida ao nome de registro (desde que, é claro, utilizados para atividades lícitas). A verdade é que, infelizmente, apenas se mostram problemáticos no caso de pessoas transsexuais.
Basta dizer que ninguém questiona os nomes da Anitta, Fernanda Montenegro, Chay Suede, Cazuza, Tony Ramos ou Silvio Santos. Todos nomes sociais utilizados em substituição, respectivamente, a Larissa, Arlete Pinheiro, Roobertchay Domingues, Agenor de Miranda, Antonio de Carvalho e Senor Abravanel.
Respeita-se sem questionar os nomes sociais utilizados por pessoas cisgêneros (quem se identifica com o gênero que lhes foi atribuído ao nascimento), mas continuam relutantes em respeitá-los no caso das pessoas transgêneros por puro preconceito, evidenciando ainda mais as dificuldades que estas pessoas enfrentam.
No caso de pessoas transgêneros, a questão é muito mais séria porque a relutância da sociedade em aceitar o nome social pode expor ao ridículo e até mesmo ao perigo, já que vivemos no país que mais mata pessoas trans no mundo, segundo a ONG Transgender Europe.
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A dificuldade de aceitação dos nomes sociais é um dos fatos que acaba obrigando pessoas transgêneros a se submeter a um processo de retificação de nome de registro, e assim alterar definitivamente seus nomes para serem respeitadas socialmente.
Infelizmente, com a relutância social para respeitar, somente a alteração em documentos não oficiais (quando conseguem) não assegura o direito à dignidade humana que todas as pessoas merecem.
Saiba mais sobre a dignidade da pessoa humano e o mínimo existencial.
Da mesma forma, embora represente um grande avanço social, o Decreto 8727/2016, que assegura a possibilidade de utilização do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e transexuais no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, acabou se mostrando tardio e ineficaz.
Judicialização do processo de alteração do nome
Durante muitos anos exigiu-se que a alteração do nome ocorresse somente pela via judicial, obrigando as pessoas a um processo longo, burocrático e extremamente subjetivo.
Pela via judicial poucas pessoas conseguiam o direito de alterar seus nomes, sendo este direito ainda mais difícil para as pessoas transgêneros. Isso porque entendia-se que a imutabilidade do nome deveria ser relativizada apenas em alguns poucos casos, a critério julgador.
Na prática, algumas pessoas até conseguem alterar o nome de registro para acrescentar o nome social, sem alteração do restante, tal como a Xuxa, que passou a chamar-se Maria da Graça Xuxa Meneghel. Entretanto, essa alteração é logicamente ineficaz no caso de pessoas transexuais.
O processo de alteração de nome das pessoas transgêneros acabava sendo muito mais burocrático e doloroso, submetendo essas pessoas a extenso julgamento moral e muitas vezes condicionando a alteração à submissão prévia à cirurgia de transgenitalização.
Isso, evidentemente, inviabiliza o direito. E, além disso, não são todas as pessoas transgêneros que querem ou podem realizar a cirurgia.
Julgamento no STF sobre a alteração do nome
Em março de 2018, o Supremo Tribunal Federal reconheceu, em uma votação memorável, a importância de retirar a obrigatoriedade da cirurgia e a solicitação judicial para a retificação do nome.
Desde então é possível que pessoas trans procedam à alteração do nome em cartório, bastando a autoidentificação como transgênero, e sem condicionamento à cirurgia.
A tese definida foi a seguinte:
i) O transgênero tem direito fundamental subjetivo à alteração de seu prenome e de sua classificação de gênero no registro civil, não se exigindo, para tanto, nada além da manifestação de vontade do indivíduo, o qual poderá exercer tal faculdade tanto pela via judicial como diretamente pela via administrativa;
STF. Tese definida no RE 670.422, rel. min. Dias Toffoli, P, j. 15-8- 2018, Tema 7611
ii) Essa alteração deve ser averbada à margem do assento de nascimento, vedada a inclusão do termo “transgênero”;
iii) Nas certidões do registro não constará nenhuma observação sobre a origem do ato, vedada a expedição de certidão de inteiro teor, salvo a requerimento do próprio interessado ou por determinação judicial;
iv) Efetuando-se o procedimento pela via judicial, caberá ao magistrado determinar de ofício ou a requerimento do interessado a expedição de mandados específicos para a alteração dos demais registros nos órgãos públicos ou privados pertinentes, os quais deverão preservar o sigilo sobre a origem dos atos.”
O julgamento representou uma mudança imensa na vida de pessoas transgêneros proporcionando a facilitação da alteração do nome e visando assegurar-lhes a dignidade e o respeito no tratamento em sociedade.
Conclusão
Não há dúvidas no sentido de que o direito ao nome e à identificação com o próprio nome está intimamente ligado à dignidade humana, sendo essencial o exercício constante da empatia para que este direito seja ampliado e assegurado também as pessoas trans.
Neste sentido, a desjudicialização e desburocratização do procedimento de alteração do nome de pessoas transexuais representa um ganho social imenso.
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Advogada. Sou pós Graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas); Bacharel em Direito pela Faculdade Milton Campos; Analista Comportamental e Professional Coach pelo Instituto Basileiro de Coach; Advogada no Escritório René...
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