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Capítulo I – Das normas fundamentais do processo civil

Art. 1 a 12
Comentado por Bruno Molina Meles
14 ago 2023
Atualizado em 6 set 2023

Art. 1º O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.

“Embora toda norma infraconstitucional deva ser criada e interpretada de acordo com a Constituição Federal, buscou-se deixar claro neste artigo (e no primeiro capítulo deste código) que o processo civil deve ser utilizado como um instrumento de efetividade dos valores constitucionais.

Em outras palavras, este artigo relembra o leitor que o Código de Processo Civil deve ser compreendido e suas dúvidas interpretativas devem ser resolvidas conforme os valores previstos na Constituição Federal, deixando claro que o processo representa um meio para a efetivação dos valores constitucionais para se chegar a uma decisão justa, eficaz e rápida.” 

Jurisprudência: O proceder levado a efeito pelas instâncias ordinárias aparta-se, por completo, do chamado processo civil constitucional, concebido como garantia individual e destinado a dar concretude às normas fundamentais estruturantes do processo civil, utilizadas, inclusive, como vetor interpretativo de todo o sistema processual civil. (STJ. REsp n. 2.037.088/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 7/3/2023, DJe de 13/3/2023.)

Art. 2º O processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei.

“Este artigo estabelece os princípios da demanda e da inércia da jurisdição (também previstos nos artigos 141 e 490), pelo qual o processo (em regra) não se inicia de forma automática (ex officio), mas sim por uma iniciativa da parte. Ou seja, o judiciário precisa ser acionado para que o processo seja iniciado, pois a jurisdição não é uma atividade espontânea do Estado (princípio da inércia).

 

Após esse início, o processo caminha por impulso oficial, ou seja, por atos do juiz e dos auxiliares da justiça, mas as partes continuam sendo obrigadas a realizar certos atos durante o processo. Por exemplo, se o autor não der andamento ao processo sobre ato que lhe cabia, este poderá ser extinto (arts. 485, II e III).” 

 

Jurisprudência 1: Não se constitui ato decisório passível de ser atacado por meio de recurso o despacho que converte o feito em diligência (…), porquanto sua natureza jurídica é de mero impulso oficial  (STJ. AgInt no REsp n. 1.517.809/RJ, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 13/3/2023, DJe de 16/3/2023.).

 

Jurisprudência 2: O início do processo se dá pela iniciativa do interessado e se desenvolve por impulso oficial, nos termos do artigo 262 do Código de Processo Civil de 1973 (artigo 2º do Código de Processo Civil de 2015), entretanto, o referido princípio não é absoluto. Destarte, deve o autor diligenciar para obter o regular andamento do feito, uma vez que a distribuição do processo não exonera a parte de acompanhar o andamento processual. (STJ. EDcl no AgInt no AREsp n. 2.033.339/RJ, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 19/9/2022, DJe de 30/9/2022.).

Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.

§ 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei.

§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.

§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.

“Este artigo concretiza o princípio fundamental previsto no art. 5º, XXXV da Constituição Federal de que todos têm acesso à justiça para buscar a proteção de um direito ou para defendê-lo, sendo atualmente compreendido que este direito exige uma proteção efetiva e justa.

Em outras palavras, todos possuem o direito de acionar o Poder Judiciário e obter uma resposta sobre qualquer pretensão, resposta essa que deverá seguir todos os princípios processuais e constitucionais estabelecidos pela legislação (imparcialidade, contraditório, ampla defesa, dentre outros).

Ao mesmo tempo, o Código permite a substituição voluntária deste acesso pela justiça arbitral (arts. 42, 337, X) desde que respeitadas as condições legais em cada caso, tais como a Lei nº. 9.307/96 e art. 51, VII da Lei 8.078/90.

Por fim, este artigo estimula todos a buscarem uma solução consensual do conflito, incentivando a adoção de medidas que criem a necessidade de buscar uma conciliação, de modo que apenas subsidiariamente o ônus dessa decisão será deixada para o juiz, contribuindo para um maior grau de satisfação das partes e maior celeridade do processo.”

Jurisprudência 1: Uma vez que a interpretação das normas do Ordenamento Jurídico brasileiro deve, necessariamente, ser consequência da Carta de 1988, importante destacar o princípio da inafastabilidade da jurisdição, expressamente disposto no art. 5º, XXXV, da CF/1988. O dispositivo constitucional não é destinado somente aos legisladores, mas também a qualquer autoridade pública. Dessa forma, o Poder Judiciário não pode se furtar do dever de apreciar possível lesão ou ameaça a direito. (STJ. AgInt na PET na AR n. 5.196/RJ, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 18/11/2021, DJe de 2/12/2021.).

 

Jurisprudência 2: O Código de Processo Civil de 2015 dispensou especial tratamento, pelo Poder Judiciário, da solução consensual de conflitos. Nesta medida, determina o art. 3º, § 3º, do Código que a conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial. (STJ., EDcl no AgInt no AREsp n. 1.727.927/SP, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 27/3/2023, DJe de 31/3/2023.).

 

Jurisprudência 3: Vive-se um tempo em que é imperativo repensar o modo excessivamente litigioso de resolução das controvérsias (…). Não há melhor forma de resolver conflitos do que aquela oriunda das próprias partes. A conciliação entre partes em conflito é a forma mais legítima de pacificação, pois nela há a presença insofismável do consenso. (…) não se olvida que o Poder Público pode buscar e realizar medidas consensuais, como se observa nos textos das Leis 9.469/1997 (acordo) e 13.140/2015 (mediação). (STJ. REsp n. 1.670.907/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 13/8/2019, DJe de 6/11/2019.)

 Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.

“O artigo possui fundamento no art. 5º, LXXVIII da Constituição Federal para estabelecer o direito à razoável duração do processo pelas partes. Assim, cabe aos Poderes (Executivo, Judiciário e Legislativo) a criação de medidas para que essa norma seja aplicada e o processo possa ser solucionado em tempo razoável, que diz respeito não apenas ao prazo para prolação de uma sentença, mas também para a conclusão da atividade satisfativa.

Em outras palavras, o artigo determina que dentro de um prazo razoável devem ocorrer tanto o reconhecimento de um direito da parte quanto a sua efetiva realização. Ou seja, este dispositivo só estará preenchido se a sentença, os recursos, o cumprimento de sentença e a satisfação tiverem sido finalizados em um prazo adequado.

Jurisprudência 1: O CPC/2015, ao disciplinar o arrolamento sumário, transferiu para a esfera administrativa as questões atinentes ao imposto de transmissão causa mortis, evidenciando que a opção legislativa atual prioriza a agilidade da partilha amigável, ao focar, teleologicamente, na simplificação e na flexibilização dos procedimentos envolvendo o tributo, alinhada com a celeridade e a efetividade, e em harmonia com o princípio constitucional da razoável duração do processo. (STJ. REsp n. 1.896.526/DF, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Seção, julgado em 26/10/2022, DJe de 28/10/2022.)

 

Jurisprudência 2: Os advogados devem lançar, em primeira mão, um olhar crítico sobre a viabilidade e probabilidade de êxito da demanda antes de iniciá-la. Em seguida, devem informar seus clientes com o máximo de transparência, para que juntos possam tomar a decisão mais racional considerando os custos de uma possível sucumbência. Promove-se, dessa forma, uma litigância mais responsável, em benefício dos princípios da razoável duração do processo e da eficiência da prestação jurisdicional. (STJ. (REsp n. 1.850.512/SP, relator Ministro Og Fernandes, Corte Especial, julgado em 16/3/2022, DJe de 31/5/2022.)” 

Art. 5º Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé.

“Neste artigo, o processo naturalmente se pauta em um conflito de interesses antagônicos (autor e réu), mas algumas regras devem ser obedecidas para que se evite exageros e abusos, independentemente de ato intencional, como por exemplo, não se manifestar de forma contraditória no processo.

 

Assim, além dos deveres das partes e dos seus procuradores (arts. 77 a 80), o Código estabeleceu neste artigo uma regra geral (padrão) de boa conduta, por meio do princípio da boa-fé objetiva (também previsto no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor), de modo que todos devem agir com lealdade, honestidade e lisura.

 

Jurisprudência 1: Esta Corte Superior entende que a suscitação tardia da nulidade, somente após a ciência de resultado de mérito desfavorável e quando óbvio o conhecimento do referido vício muito anteriormente à arguição, configura a chamada nulidade de algibeira, manobra processual que não se coaduna com a boa-fé processual. (STJ. AgInt nos EDcl no AgInt no AREsp n. 2.220.571/RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 5/6/2023, DJe de 7/6/2023.)

 

Jurisprudência 2: A recorribilidade vazia, infundada, como in casu, tão somente com nítido intuito protelatório, configura abuso do direito de recorrer e não é admissível em nosso ordenamento jurídico, notadamente em respeito aos postulados da lealdade e boa fé processual, além de se afigurar desvirtuamento do próprio cânone da ampla defesa. (EDcl nos EDcl no AgRg no RE nos EDcl nos EDcl no RHC n. 59.542/PE, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Corte Especial, julgado em 21/11/2018, DJe de 28/11/2018.)

 

Jurisprudência 3: Não é qualquer erro na divulgação de informação pelo próprio Judiciário que se considera apto a gerar a devolução de prazo à parte para a prática do ato processual, mas aquele que, como na hipótese, atua como causa eficiente de um justificado e induzido equívoco da parte, ao ponto de tornar indelével a pecha da violação do dever de boa-fé processual exigido do órgão jurisdicional diante da repercussão causada. (STJ. AgInt no REsp n. 1.800.327/SP, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 10/10/2022, DJe de 13/10/2022.)”

Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.

“Este artigo traz o princípio da cooperação, pelo qual além do dever de agir com boa-fé já previsto no artigo anterior, as partes devem cooperar para que se obtenha uma solução no processo em tempo razoável, buscando uma decisão justa e efetiva.

 

Assim, devem as partes colaborar com o juiz (e também entre si) levando ao processo alegações e provas que auxiliarão o juiz no seu convencimento, que passa a ser integrante do debate, permitindo a todos uma função democrática na formação da melhor decisão final. Essa cooperação pode se dar pelos deveres de esclarecimento, consulta e de prevenção no processo, como por exemplo, para evitar a declaração de nulidade de algum ato.

 

Jurisprudência 1: (…) Os deveres de lealdade, esclarecimento, consulta e prevenção decorrem do princípio cooperativo previsto no art. 6º do CPC/2015, o qual, entretanto, não obsta a extinção do processo sem resolução do mérito quando presente vício de natureza insanável. (…) (STJ. RMS n. 60.346/AP, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 13/6/2023, DJe de 15/6/2023.)

 

Jurisprudência 2: Todo aquele que, de qualquer forma, participe do processo, deve obediência ao dever de cooperação (art. 6.º do Código de Processo Civil). Nesse sentido, afigura-se contrário ao dispositivo legal em comento a impetração de mais de um habeas corpus, com o mesmo objeto – notadamente quando já transitada em julgado a anterior decisão desta Corte (…). (STJ. AgRg no HC n. 800.240/PB, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 8/5/2023, DJe de 16/5/2023.)”

Art. 7º É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório.

“Trata-se de um princípio geral do processo consagrado pelo artigo 5º caput da Constituição Federal, pelo qual compete ao juiz assegurar às partes tratamento igualitário e imparcial, sem favorecimento de qualquer lado, por meio de direitos e deveres iguais, sempre mediante o contraditório.

 

Essa paridade, entretanto, não é apenas formal, mas isonômica, de modo que se as partes estiverem em posições desniveladas (como àquelas hipossuficientes ou em uma relação de consumo, por exemplo), o juiz deverá primeiro equilibrá-las processualmente (tais como a concessão de gratuidade ou inversão do ônus da prova), para que a partir disso, possam ter um tratamento igual no exercício desses direitos e faculdades processuais.

 

Jurisprudência: A inversão do ônus da prova cumpre papel ético-político, mas também jurídico, de equilibrar, no processo civil, as posições dos litigantes em conflito, de modo a evitar que a fraqueza processual gritante de um não corresponda tout court à vitória do outro, passaporte para negar àquele o que lhe cabe de direito. A “paridade de tratamento”, essência do art. 7º do CPC/2015, carrega sentido de genuína paridade real, e não apenas de oca paridade formal, garantia inútil por ser carente de efetividade. É dever do juiz assegurar a paridade real, inclusive com a inversão do ônus da prova. (STJ. AREsp n. 1.682.349/DF, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 13/10/2020, DJe de 22/10/2020.)”

Art. 8º Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.

“Esse artigo reforça a previsão contida no art. 5º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº. 4.657/42) para impor ao juiz o dever de solucionar o conflito dentro dos parâmetros dos fins sociais e exigências do bem comum, respeitando os princípios previstos nos arts. 1º, III e 37 caput da Constituição Federal.

 

Assim, o artigo determina que ao aplicar o direito (não apenas a legislação, mas igualmente princípios gerais, súmulas, jurisprudência, analogia e os costumes), o juiz deverá observar a proporcionalidade, razoabilidade, legalidade, publicidade e eficiência, de modo que essa observância não se limita ao direito material, mas também na interpretação das normas processuais, de modo que estas não podem ser aplicadas friamente, sem o atendimento da sua finalidade social e bem comum.

 

Jurisprudência 1: (…) A adoção de medidas executivas atípicas apresenta-se como instrumento importante a viabilizar a satisfação da obrigação exequenda (…) é cabível desde que, verificando-se a existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável, tais medidas sejam adotadas de modo subsidiário, por meio de decisão que contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta, com observância do contraditório substancial e do postulado da proporcionalidade. (STJ. (REsp n. 2.043.328/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 18/4/2023, DJe de 20/4/2023.).

 

Jurisprudência 2: Na hipótese de cominação de ônus exorbitante a uma das partes, o art. 85 deverá ser interpretado em harmonia com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade (art. 8° do CPC) em conjunto com os critérios previstos no art. 85 do Código de Processo Civil, sendo necessária a fixação dos honorários advocatícios por equidade. (STJ. AgInt no REsp n. 1.884.879/DF, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 4/10/2021, DJe de 4/11/2021.)”

Art. 9º Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida.

Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica:

I – à tutela provisória de urgência;
II – às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos II e III ;
III – à decisão prevista no art. 701 .

“Este artigo veda a prolação de decisão sem a oitiva da parte contrária, ou seja, protege o direito fundamental ao contraditório (previsto no art. 5º, LV da Constituição Federal), como o direito da parte contrária de se defender e poder influenciar a decisão judicial em uma paridade processual (art. 7º), proibindo também a decisão surpresa.

 

Com isso, se permite que essas decisões só poderão ocorrer sem a oitiva da parte contrária em caráter excepcional, quando se tratar de tutela de urgência (arts. 300 a 302), nos tipos de tutela de evidência previstos no art. 311, incisos II e III (não todos) e na ação monitória (art. 701).

 

Jurisprudência 1: Em busca de um contraditório efetivo, o normativo previu a paridade de tratamento, o direito a ser ouvido, bem como o direito de se manifestar amplamente sobre o substrato fático que respalda a causa de pedir e o pedido, além das questões de ordem pública, cognoscíveis de ofício, não podendo o magistrado decidir sobre circunstâncias advindas de suas próprias investigações, sem que antes venha a dar conhecimento às partes” (STJ. REsp n. 1755266/SC, DJe de 20/11/1998).

 

Jurisprudência 2: Não há violação ao princípio da não surpresa quando os fatos da causa foram submetidos ao contraditório e as partes tiveram a oportunidade de se manifestar sobre o fundamento da decisão em momento anterior. (STJ. AgInt no AREsp n. 2.072.100/MG, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 8/5/2023, DJe de 10/5/2023.)”

Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.

Esse artigo proíbe a decisão surpresa, ou seja, é proibido ao juiz ou ao Tribunal decidir qualquer questão no processo, ainda que de ordem pública, sem que as partes tenham tido oportunidade de se manifestarem previamente, o que está de acordo com os princípios do devido processo legal e do contraditório, previstos nos artigos 5º caput, LIV e LV da Constituição Federal.

 

Jurisprudência 1: O ‘fundamento’ ao qual se refere o art. 10 do CPC/2015 é o fundamento jurídico – circunstância de fato qualificada pelo direito, em que se baseia a pretensão ou a defesa, ou que possa ter influência no julgamento, mesmo que superveniente ao ajuizamento da ação -, não se confundindo com o fundamento legal (dispositivo de lei regente da matéria). A aplicação do princípio da não surpresa não impõe, portanto, ao julgador que informe previamente às partes quais os dispositivos legais passíveis de aplicação para o exame da causa. O conhecimento geral da lei é presunção jure et de jure (STJ. EDcl no Resp n° 1.280.825/RJ, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 27/6/2017, DJe 1/8/2017.)

 

Jurisprudência 2: Decorrente do princípio do contraditório, a vedação a decisões surpresa tem por escopo permitir às partes, em procedimento dialógico, o exercício das faculdades de participação nos atos do processo e de exposição de argumentos para influir na decisão judicial, impondo aos juízes, mesmo em face de matérias de ordem pública e cognoscíveis de ofício, o dever de facultar prévia manifestação dos sujeitos processuais a respeito dos elementos fáticos e jurídicos a serem considerados pelo órgão julgador. (STJ. REsp n. 2.016.601/SP, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 29/11/2022, DJe de 12/12/2022.).”

Art. 11. Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade.

Parágrafo único. Nos casos de segredo de justiça, pode ser autorizada a presença somente das partes, de seus advogados, de defensores públicos ou do Ministério Público.

“A regra é que os processos e julgamentos sejam públicos como uma norma fundamental de transparência dos agentes públicos para fiscalização de seus atos, permitindo-se o sigilo apenas quando a lei ou o interesse público exigirem a limitação desta publicidade, de modo que nesta hipótese, o processo ficará restrito às partes e seus procuradores, conforme determina o art. 5º, LX da Constituição Federal.

Este artigo também determina que todas as decisões sejam fundamentadas, sob pena de nulidade, conforme previsto no art. 93, X da Constituição Federal, pois as partes possuem o direito de entender as razões de fato e de direito que justificaram determinada decisão.

No regime de transparência brasileiro, vige o Princípio da Máxima Divulgação: a publicidade é regra, e o sigilo, exceção, sem subterfúgios, anacronismos jurídicos ou meias-medidas. É dever do Estado demonstrar razões consistentes para negar a publicidade ativa e ainda mais fortes para rejeitar o atendimento ao dever de transparência passiva. (STJ. REsp n. 1.857.098/MS, relator Ministro Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 11/5/2022, DJe de 24/5/2022.)

Este Tribunal Superior considera ser adequada a adoção da fundamentação por referência ou remissão (per relationem), quando exauriente e suficiente à completa solução da lide; situação inocorrente quando não serve ao enfrentamento de todos os argumentos relevantes invocados pelas partes. (STJ. AgInt no REsp n. 1.967.259/RJ, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 13/2/2023, DJe de 16/2/2023.).

Não há falar em omissão, falta de fundamentação e/ou negativa de prestação jurisdicional, na medida em que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro dirimiu, fundamentadamente, a questão que lhe foi submetida, apreciando a controvérsia posta nos autos. (STJ. (AgInt no REsp n. 1.884.435/RJ, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 12/6/2023, DJe de 14/6/2023.)”

Art. 12. Os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão.         (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência)

§ 1º A lista de processos aptos a julgamento deverá estar permanentemente à disposição para consulta pública em cartório e na rede mundial de computadores.

§ 2º Estão excluídos da regra do caput:

I – as sentenças proferidas em audiência, homologatórias de acordo ou de improcedência liminar do pedido;
II – o julgamento de processos em bloco para aplicação de tese jurídica firmada em julgamento de casos repetitivos;
III – o julgamento de recursos repetitivos ou de incidente de resolução de demandas repetitivas;
IV – as decisões proferidas com base nos arts. 485 e 932;
V – o julgamento de embargos de declaração;
VI – o julgamento de agravo interno;
VII – as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça;
VIII – os processos criminais, nos órgãos jurisdicionais que tenham competência penal;
IX – a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada.

§ 3º Após elaboração de lista própria, respeitar-se-á a ordem cronológica das conclusões entre as preferências legais.

§ 4º Após a inclusão do processo na lista de que trata o § 1º, o requerimento formulado pela parte não altera a ordem cronológica para a decisão, exceto quando implicar a reabertura da instrução ou a conversão do julgamento em diligência.

§ 5º Decidido o requerimento previsto no § 4º, o processo retornará à mesma posição em que anteriormente se encontrava na lista.

§ 6º Ocupará o primeiro lugar na lista prevista no § 1º ou, conforme o caso, no § 3º, o processo que:

I – tiver sua sentença ou acórdão anulado, salvo quando houver necessidade de realização de diligência ou de complementação da instrução;
II – se enquadrar na hipótese do art. 1.040, inciso II.

“O artigo determina, com base no direito fundamental da razoável duração do processo previsto no art. 5º LXXVIII da Constituição Federal, que os magistrados deverão dar preferência (sempre que possível) a ordem cronológica dos processos recebidos no gabinete para julgamento (conclusão), como uma forma de evitar que determinadas partes tenham sua decisão postergada em detrimento de outras, incidindo também o princípio da isonomia (arts. 10 e 11).

 

Para que este dever seja cumprido, inclusive em função do princípio da publicidade, a lista dos processos a serem julgados deverá ser disponibilizada no cartório, bem como pela internet para que possam ser acompanhados pelas partes.

 

Os incisos I a IX, entretanto, preveem as diversas exceções a essa regra geral, quando se tratar de processo criminal, homologação de acordo, julgamento de recursos repetitivos, preferência legal (exemplo: tramitação prioritária do idoso, mandado de segurança, etc.), dentre outros.

 

Enunciado 34 ENFAM: Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento da Magistratura – A violação das regras dos arts. 12 e 153 do CPC/2015 não é causa de nulidade dos atos praticados no processo decidido/cumprido fora da ordem cronológica, tampouco caracteriza, por si só, parcialidade do julgador ou do serventuário.

 

O dever de observar a ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão, previsto no art. 12 do Código de Processo Civil, não tem natureza absoluta, e, caso não seja observado, não resulta por si só em nulidade processual. (STJ. AgRg no HC n. 533.831/PR, relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 1/9/2020, DJe de 9/9/2020.)”

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Advogado desde 2010, Contador desde 2019. Mestre em Direito, Justiça e Desenvolvimento. Pós Graduado em Direito Digital. Especialista em Direito Processual Civil e Direito Constitucional. Coautor de obras e artigos jurídicos. Titular do escritório Bruno Molina Sociedade Individual de Advocacia...

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